Derecho y Cambio Social

 
 

 

 

A PERÍCIA EM CASOS DE MORTE SOB CUSTÓDIA

Genival Veloso de França *


 

 

Sumário: O autor chama a atenção da necessidade de a autoridade pública competente  considerar a necropsia como obrigatória em toda morte verificada em pessoas detidas e enclausuradas, além de ressaltar os cuidados que a perícia deve ter quando diante de uma avaliação na determinação de sua causa jurídica de morte. Chama a atenção ainda para uma série de cuidados e para a necessidade da criação de um Registro Nacional e Mortes sob Custódia, recomenda que tais mortes tenham obrigatoriamente uma investigação criminal, estimula os órgãos de direitos humanos governamentais ou não governamentais incluírem em seus programas e projetos o tema “morte sob custódia” e ressalta a importância da  capacitação de médicos legistas no sentido de aperfeiçoarem seus conhecimentos diante desta modalidade de óbito.

 

Palavras chave: Morte em clausura.  Morte em privados de liberdade. Morte em detenção.

 

 

Introdução

Todos os casos de morte de pessoas que se encontram detidas em delegacias, prisões, hospícios ou manicômios judiciários, ou seja, as que morrem em ambientes de privação da liberdade merecem uma atitude enérgica do poder público e um tratamento especial por parte da perícia médico legal em face da garantia que a sociedade tem de que a autoridade agiu de forma correta. Também devem ser inclusas neste estudo as mortes que se verificam durante a detenção ou durante as transferências dos detidos para hospitais ou para outras instituições de custódia.

Tal posição é a que se espera de todo governo democrático que tem políticas claras de direitos humanos e primam pela manutenção de um estado de direito. Este e outros cuidados contribuirão com certeza para uma série de informações que servirão para evitar que  mortes violentas venham acontecer em mesmas circunstâncias.

Isto também deve influenciar a comunidade científica médico legal no sentido de elaborar programas de formação de equipes capacitadas a diagnosticar com precisão e responder às indagações a respeito das mortes de indivíduos enclausurados.

Desta forma, todas as mortes ocorridas em tais instituições, notadamente de indivíduos que faleceram sem assistência médica, no curso de um processo clínico de evolução atípica ou de morte súbita ou inesperada, devem ser consideradas, a priori, como “mortes de causa suspeita” e, portanto, da apreciação médico-legal. Com certeza essas mortes, especialmente quando súbitas, além de motivarem muita especulação são as de maior complexidade na determinação da causa médica e do mecanismo da morte.

Além da possibilidade de morte por tortura ou por outro meio insidioso ou cruel, pode-se verificar a morte por execução sumária, arbitrária ou extralegal. Hoje no Brasil, certamente, esta é a forma mais ostensiva e crescente de desrespeito aos direitos humanos praticada por uma fração da polícia ou pelas milícias paramilitares “de extermínio” a serviço das organizações criminosas ou de assassinos a mando de interesses individuais ou de grupos contrariados.  

Os que trabalham com perícia em casos desta natureza  sabem que evidências concretas de provas desse tipo de crime são difíceis de serem detectadas pela sofisticação dos meios utilizados e pela esperteza dos agentes em omitir tais ocorrências, negando ou não enviando as vítimas ou omitindo informações aos órgãos especializados da perícia oficial.

É muito importante que se tenha um padrão pericial para estes exames, pois vem se observando sérias divergências na forma de conduzir esta perícia e que a existência de um protocolo em muito iria contribuir nesta área legispericial. A prática pericial hodierna não admite mais as práticas periciais feitas de forma desorganizada e contingente, mas sempre através de um disciplinado itinerário que dê aos analistas do caso a certeza de que todas as fases da perícia foram feitas de maneira completa e seqüenciada. Este é o modelo de trabalhar que se vem exigindo em todos os centros operacionais da prova médico-legal. Neste tipo de avaliação pericial sente-se também a necessidade de contar com normas internacionais como resultado prático para suas conclusões e trocas de experiências.

A finalidade em tais perícias é reunir o maior número de informações para assegurar a identificação do morto, a determinação precisa da causa mortis e da causa jurídica da morte, o tempo aproximado de morte e a descrição e os aspectos característicos das lesões violentas.  Para tanto se propõe que o cadáver fique à disposição da instituição médico-legal pelo menos por 12 horas. O local de morte deve ser compulsoriamente preservado e bem investigado pela perícia criminal.

E, por fim, o uso de todos os meios de proteção e de respeito à “cadeia de custódia” das evidências. O envio aos laboratórios e a chamada cadeia de proteção dos elementos da prova (documento escrito onde se registram os movimentos e ações sobre amostras) é de suma importância na investigação da morte por execução sumária, pois com sua quebra pode por abaixo a credibilidade que se espera da prova.

Conceito de morte sob custódia

Chama-se de morte sob custódia aquela que ocorre em pessoas privadas de liberdade e sobre a qual se pode aventar uma situação de morte violenta. Espera-se que, pelo menos como questão de fato, todas estas mortes tenham obrigatoriamente uma investigação criminal e se inicie com a competente necropsia.

Também seria interessante que se criasse um “Registro Nacional de Morte sob Custódia” para se saber a extensão do problema, suas características, intensidade e sua incidência a partir de instituições, cidades e estados.

Seria ainda interessante que os órgãos de direitos humanos governamentais ou não governamentais incluíssem em seus programas e projetos este tema, e que os médicos legistas fossem capacitados no sentido de aperfeiçoarem seus conhecfimentos diante de tais óbitos.

Dentro deste conceito devem ser incluídos:

1. Os que morrem durante a detenção ou em transferência para instituições prisionais ou por necessidade médica ou processual.

2. Os que morrem em delegacias e centros de custódia ou em tentativas de fuga.

3. Os que morrem em estabelecimentos de recuperação de menores.

4. Os que morrem internos involuntariamente em estabelecimentos psiquiátricos.

5. Os que morem em manicômios psiquiátricos.

Violência institucional no Brasil

As instituições em nosso país que disciplinam as relações sociais e que administram a repressão (polícia), que julgam e aplicam as sanções (justiça) e que executam a punição (prisão) não deixam, de certo modo, de exercer ou tolerar a violência.

Parte da estrutura policial tornou-se viciada pela intolerância e pela corrupção, imbuída de uma mentalidade repressiva, reacionária e preconceituosa, na mais absoluta fidelidade que o Sistema lhe impôs desde os anos de repressão. Este modo de atuar do aparelho policial não deixa de ser uma fonte permanente de conflitos, fazendo que essa corporação se constitua numa forma de violência institucional.

De certa forma pode-se dizer que o aparelho judicial também constitui numa modalidade de violência institucional, a partir do instante em que suas decisões se inclinam obstinadamente para o lado do legalismo insensível. Não é outro senão o próprio Presidente do Supremo Tribunal Federal que disse: “necessitamos de um sistema que seja processualmente célere, politicamente independente, socialmente eficaz e tecnicamente eficiente” (Revista Veja, ano 32, n.º 12, 22/mar./1999, pag. 36). E mais: as leis que são seguidas fielmente pelo aparelho judicial são elaboradas a partir dos interesses que os legisladores defendem e representam.

A violência do aparelho carcerário é certamente a mais impiedosa e humilhante porque o presidiário, principalmente o de crimes comuns, representa para o poder e para uma fração da sociedade, uma escória. Não passa pelos critérios dessas pessoas que a pena seja uma medida de recuperação e de ressocialização, mas tão-só um instrumento de vingança e de reparação. O próprio sentido de intimidação e de excessivo rigor punitivo não deixa de constituir uma modalidade de terrorismo oficial. Tudo que existe de sórdido no sistema carcerário: a prepotência, a falta de disciplina e a brutalidade gratuita de alguns agentes do poder e o seu desdém pelas entidades que promovem a defesa e a proteção dos direitos humanos, é com certeza a manifestação mais abjeta da intolerância, da irreverência e do arbítrio.

Recomendações em perícias de casos de tortura e de execução sumária

Os que trabalham com perícia em casos de tortura, sevícia ou maus tratos, principalmente quando as vítimas estão sob a tutela judicial, sabem que as evidências desse crime são difíceis pela sofisticação dos meios utilizados e pela convivência dos agentes do poder em omitir tais ocorrências não enviando as vítimas aos órgãos especializados da perícia oficial. Some-se a isso o temor que as vítimas têm de denunciar seus agressores.

Por estas e outras razões a Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República criou o Grupo de Trabalho “Tortura e Perícia Forense”, entre outras, com a finalidade de adaptar o Protocolo de Istambul a nossa realidade, onde estivessem estabelecidas “orientações e regras a serem respeitadas pelos órgãos periciais, peritos e profissionais de perícia forense”.

Seguem as recomendações:    

1 – valorizar no exame físico o estudo esquelético-tegumentar. 

2 – descrever detalhadamente a sede e as características dos ferimentos. 

3 – registrar em esquemas corporais todas as lesões encontradas.

4 – fotografar as lesões e alterações existentes nos  exames interno e externo.

5 – detalhar em todas as lesões, independente do seu vulto, a forma, idade, dimensões, localização e particularidades.

6 – radiografar, quando possível, todos os segmentos e regiões agredidos ou suspeitos de violência.

7 – trabalhar sempre em equipe

8 – examinar à luz do dia

9 – usar os meios subsidiários disponíveis

10 - avaliar de forma objetiva e imparcial

Por fim, recomenda-se que os peritos nunca usem as informações como propostas pessoais, qualquer que sejam suas posições políticas ou ideológicas.

Necropsia em caos de morte sob custódia por tortura ou por outro meio cruel

Quando da perícia em casos de morte súbita em indivíduos detidos ou em detenção forem evidenciadas lesões orgânicas significativas e incompatíveis com a continuidade da vida, além da ausência de lesões ou alterações produzidas por ação violenta, não há o que duvidar de morte natural, melhor chamada de “morte com antecedentes patológicos” ou de “morte orgânica natural”.

No entanto, se são diagnosticadas lesões orgânicas mas se essas alterações morfopatológicas não se mostram totalmente suficiente para explicar a morte, então com certeza estamos diante da situação mais complexa e difícil da perícia médico-legal, ainda mais quando não existe qualquer manifestação exógena que se possa atribuir como causa do óbito.

Pode excepcionalmente ocorrer uma situação em que o indivíduo é vítima de morte súbita, não tem registro de antecedentes patológicos, nem lesões orgânicas evidentes na necropsia, além, de não apresentar manifestações de agressão violenta, registrada por aquilo que se chamou de “necropsia branca”. Desde que se afaste definitivamente a causa violenta de morte, tenha-se tomado os cuidados necessários nas pesquisas toxicológicas e anátomo-patológica, não há o que fugir da morte por causa indeterminada. Ainda mais se existem os fatores não violentos de inibição sobre regiões reflexógenas, predisposição constitucional e estados psíquicos inibidores.

Como última hipótese àquelas situações de morte inesperada, estão as que se evidenciam lesões e alterações típicas que justificam a morte violenta.

No primeiro caso, quando da chamada “morte súbita lesional”, onde o óbito é diagnosticado e explicado de forma segura pela presença de antecedentes patológicos, isso deve ficar confirmado de maneira clara, pois dificilmente tal evento deixa de apresentar alguns constrangimentos pelas insinuações de dúvida e desconfiança.

As causas das chamadas mortes naturais mais comuns são: cárdio-circulatórias (cardiopatias isquêmicas, alterações valvulares, cardiomiopatias, miocardites, endocardites, alterações congênitas, anomalias no sistema de condução, rupturas de aneurismas, etc.), respiratórias (broncopneumonias, tuberculose, pneumoconioses, etc.), digestivas (processos hemorrágicos, enfarte intestinal, pancreatite, cirrose, etc.), urogenitais (afecções renais, lesões decorrentes da gravidez e do parto); encefalomeníngeas (processos hemorrágicos, tromboembólicos e infecciosos), endócrinas (diabetes), obstétricas (aborto, gravidez ectópica, infecção puerperal, etc.), entre outras.

Nas situações de morte súbita sem registro de antecedentes patológicos, com alterações orgânicas de menor importância e ausência de manifestações violentas, o caso é ainda mais complexo e pode ser explicada como “morte súbita funcional com base patológica”. Exemplo: arritmia cardíaca. Quando isso ocorrer, é importante que se examine cuidadosamente o local dos fatos, se analise as informações do serviço médico do presídio ou do médico assistente e se use os meios subsidiários mais adequados a cada caso, com destaque para o exame toxicológico.

Mais cuidado ainda se deve ter quando não existe qualquer alteração orgânica que justifique a morte, nem se encontram manifestações de ação violenta, mas o indivíduo é portador de alguma perturbação funcional. Em alguns casos pode-se justificar como “morte súbita funcional”. Exemplo: a morte pós-crise convulsiva. Nesses casos devem-se usar todos os meios complementares disponíveis no sentido de afastar a morte violenta e, se possível, confirmar a morte natural a partir da confirmação daquelas perturbações.

Por fim, os casos de morte violenta cuja perícia não deve apenas se restringir ao diagnóstico da causa da morte e da ação ou do meio causador, mas também ao estudo do mecanismo e das circunstâncias em que esse óbito ocorreu, no sentido de se determinar sua causa jurídica.

Recomenda-se que em tais situações a necropsia seja realizada de forma completa, metódica, sem pressa, sistemática e ilustrativa, com a anotação de todos os dados e com a participação de no mínimo outro legista. Além disso, devem-se usar fotografias, gráficos e esquemas, assim como os exames complementares necessários.

A. Exame externo do cadáver. Nos casos de morte violenta, em geral, o exame externo tem muita importância não só para o desfecho do diagnóstico da causa da morte, como também para se considerar seu mecanismo, sua etiologia jurídica e as circunstâncias que antecederam o óbito. Essa é a regra, embora possa em determinada situação soar diferente. Nas mortes em que se evidencia tortura, sevícias ou outros meios degradantes, desumanos ou cruéis, os achados analisados no hábito externo do cadáver são de muita relevância. Os elementos mais significativos nessa inspeção são:

      A.1 –Sinais relativos à identificação do morto. Todos os elementos antropológicos e antropométricos, como estigmas pessoais e profissionais, estatura, malformações congênitas e adquiridas, além da descrição de cicatrizes, tatuagens e das vestes, assim como a coleta de impressões digitais e de sangue, registro da presença, alteração e ausência dos dentes e do estudo fotográfico. A identificação da vítima é sempre necessária mesmo com o reconhecimento de seus familiares ou de terceiros, e por isso se impõe o registro completo de todos os elementos antropológicos, antropométricos e a coleta de  material para exame em DNA forense, assim distribuídos:

     A.2 – Sinais relativos às condições do estado de nutrição, conservação e da compleição física. Tal cuidado tem o sentido não só de determinar as condições de maus tratos por falta de higiene corporal, mas ainda de constatar sinais de desidratação e desnutrição. Essas manifestações encontradas no detento podem confirmar a privação de água e alimentos.

     A.3 – Sinais relativos aos fenômenos cadavéricos. Devem ser anotados todos os fenômenos cadavéricos abióticos consecutivos e transformativos, como rigidez cadavérica, livores hipostáticos, temperatura retal e as manifestações imediatas ou tardias da putrefação.

     A.4 - Sinais relativos ao tempo aproximado de morte. Todos os sinais acima referidos devem ser registrados num contexto que possam orientar a perícia para uma avaliação do tempo aproximado de morte, pois tal interesse pode resultar de muita utilidade quando diante de determinadas circunstâncias onde se verificou a morte.

    A.5 – Sinais relativos ao meio ou às condições onde o cadáver se encontrava. Estes são elementos muito importantes quando presentes, pois assim é possível saber se o indivíduo foi levado em vida para outro local e depois transportado para a cela onde foi achado, como por exemplo, presidiários que morreram em “sessões de afogamento” fora da cela carcerária.

    A.6 – Sinais relativos à causa da morte. Mesmo que se considere ser o diagnóstico da causa da morte o resultado do estudo externo e interno da necropsia, podemos afirmar que no caso das mortes por tortura o exame externo do cadáver apresenta um significado especial pela evidência das lesões sofridas de forma violenta. Assim, devemos considerar:

          A.6.1 – Lesões traumáticas. O exame deve ser procedido em toda superfície do corpo, pois é muito importante que as lesões esquelético-tegumentares, que são as mais freqüentes e mais visíveis, sejam valorizadas e descritas de forma correta, pois na maioria das vezes, em casos dessa espécie, elas contribuem de forma eloqüente para o diagnóstico da morte e as circunstâncias em que ela ocorreu [1].

            No estudo das lesões externas do cadáver em casos de morte por tortura devem-se valorizar as seguintes características: multiplicidade, diversidade, diversidade de idade, forma, natureza etiológica, falta de cuidados e local de predileção[2].     

            Quanto a sua natureza, as lesões podem se apresentar com as seguintes características:  a) Equimoses e hematomas são as lesões mais comuns, localizando-se mais comumente na face, tronco, extremidades e bolsa escrotal, apresentando processos evolutivos de cronologia diferente, pelas as agressões repetidas em épocas diversas; b) Escoriações generalizadas, também de idades diferentes, mais encontradas na face, nos cotovelos, joelhos, tornozelos e demais partes proeminentes do corpo; c) Edemas por constrição nos punhos e tornozelos, por compressão vascular, em face da ectasia sangüínea e linfática; d) Feridas, na maioria contusas, nas diversas regiões, com predileção pelo rosto (supercílios e lábios)¸ também de evolução distinta pelas épocas diferentes de sua produção, e quase sempre infectadas pela falta de higiene e assistência; e) Queimaduras, principalmente de cigarros acesos no dorso, no tórax e no ventre, recentes ou em forma de cicatrizes, ovais ou circulares, ou outras formas de queimaduras, as quais quando bilaterais têm maior evidência de mau trato, sendo quase sempre infectadas pela falta de cuidados. As lesões produzidas por substâncias cáusticas são muito raras devido ao seu aspecto denunciador; f) Fraturas dos ossos próprios do nariz que, após sucessivos traumas, podem produzir o chamado “nariz de boxeador”, quase sempre acompanhado de fratura do tabique nasal, com hematoma bilateral ao nível do espaço subcondral, além das fraturas de costelas e de alguns ossos longos das extremidades, sendo mais rara a fratura dos ossos da mão, dos pés, coluna e pélvis. É importante determinar a data de cada fratura;  g) Alopécias com zonas hemorrágicas difusas do couro cabeludo pelo arrancamento de tufos de cabelo; h) Edemas e ferimentos das regiões palmares e fraturas dos dedos pelo uso de palmatória; i) Lesões oculares que vão desde as retinopatias e cristalinopatias até as rupturas oculares com esvaziamento do humor vítreo; j) Lesões otológicas como ruptura dos tímpanos e otorragia provocadas por uma agressão de nome “telefone”;  l) Fraturas e avulsões dentárias por traumatismos faciais;    m) Sinais de abuso sexual de outros presidiários como manobra de tortura e humilhação da própria administração carcerária; n) Lesões eletroespecíficas produzidas pela eletricidade industrial, como técnica de tortura utilizada para obtenção de confissões, sempre em regiões ou órgãos sensíveis, como os genitais, o reto e a boca; ou pelo uso de uma cadeira com assento de zinco ou alumínio conhecida como “cadeira do dragão”. Aquelas lesões são reconhecidas como “marca elétrica de Jellineck”, na maioria das vezes macroscopicamente insignificante e podendo ter como características a forma do condutor causador da lesão, tonalidade branco-amarelada, forma circular, elítica ou estrelada, consistência endurecida, bordas altas, leito deprimido, fixa, indolor, asséptica e de fácil cicatrização. Tudo faz crer que esta lesão é acompanhada de um processo de desidratação, podendo se apresentar nas seguintes configurações: estado poroso (inúmeros alvéolos irregulares, juntos uns aos outros, com uma imagem de favo de mel), estado anfractuoso (tem um aspecto parecido com o anterior, mas com alvéolos maiores e tabiques rotos) e estado cavitário (em forma de cratera com apreciável quantidade de tecido carbonizado). As lesões eletroespecíficas (marca elétrica de Jellinek) não são muito diferentes das lesões produzidas em “sessões de choque elétrico”, a não ser o fato destas últimas não apresentarem os depósitos metálicos face os cuidados de não se deixar vestígios. Também as lesões produzidas por descargas de pistolas elétricas ("STUN GUNS"). Estas pistolas geram descargas elétricas de 50.000 a 250.000 volts, produzem paralisia muscular por algum tempo e alcançar uma distância de 4,5m. e são usadas também como tortura. Todas essas lesões são de difíceis diagnóstico quanto à idade, podendo-se dizer apenas se são recentes ou antigas, mesmo através de estudo histopatológico. o) Lesões produzidas em ambientes de baixíssima temperatura conhecidos como “geladeira”, podendo ocorrer inclusive gangrena das extremidades; p) Lesões decorrentes de avitaminoses e desnutrição em face de omissão de alimentos e por falta de cuidados adequados e de higiene corporal;  q) Lesões produzidas por insetos e roedores.

             A.6.2 – Processos patológicos naturais. Embora aparentemente de interesse mais anatomopatológico, esses achados podem oferecer respostas para o diagnóstico de causa mortis e de algumas circunstâncias, como também ajudar a compreender algumas manifestações quando do exame interno do cadáver, como: desnutrição, edemas, escaras de decúbito, conjuntivas ictéricas, processos infecciosos agudos ou crônicos, infecções dos órgãos genitais, entre tantos.

B. Exame interno do cadáver. Alguns chamam essa fase da perícia como a necropsia propriamente dita, mas já dissemos que há ocasiões ou tipos de morte onde o exame externo tem uma contribuição muito valiosa.

Aqui também o exame deve ser metódico, sistemático, sem pressa, com o registro de todos os achados e, como se opera em cavidade, deve-se trabalhar à luz do dia, sem as inconveniências da luz artificial. Todos os segmentos e cavidades devem ser explorados: cabeça, pescoço, tórax e abdome, coluna e extremidades, com destaque em alguns casos para os genitais.

As lesões internas mais comuns em casos de morte por tortura são:

      B.1 – lesões cranianas: a) hematomas sub ou extradural não são raros em sevícias com traumatismos de cabeça; b) hemorragias meningeas; c) meningite; lesões encefálicas; micro-hemorragia ventricular (valorizar a presença de pontilhado hemorrágico no assoalho dos 3º e 4º ventrículos – sinal de Piacentino, que associado à marca elétrica de Jellineck, leva a um diagnóstico de convicção der uma morte por eletroplessão).

      B.2 – Lesões cervicais: a) infiltração hemorrágica da tela subcutânea e da musculatura; b) lesões internas e externas dos vasos do pescoço; c) fraturas do osso hióide, da traquéia e das cartilagens tireóide e cricóide; d) lesões crônicas da laringe e da traquéia por tentativas de esganadura e estrangulamento ou lesões recentes em morte por estrangulamento com o antebraço (golpe da gravata).

      B.3 – lesões tóraco-abdominais: a) hemo e pneumotórax traumático; b) manifestações de afogamento como presença de líquido na árvore respiratória, nos pulmões, no estômago e primeira porção do duodeno, além dos sinais clássicos como enfisema aquoso subpleural e as manchas de Paltauf, em face de imersão do indivíduo algemado em tanques de água em processo chamado “banho chinês” ou introdução de tubos de borracha na boca com jato de água de pressão, devendo-se valorizar o conteúdo do estômago e dos intestinos; c) manifestações de asfixia, edema dos pulmões, cavidades cardíacas distendidas e cheias de sangue, presença de lesões eletroespecíficas e ausência de outras lesões, falam em favor de morte por eletricidade industrial, mesmo que se diga não existir um quadro anatomopatológico típico de morte por eletricidade; d) rupturas do fígado, do baço, do pâncreas, dos rins, estômago e dos intestinos; e) desgarramento dos ligamentos suspensores do fígado; f) hemo e pneumoperitônio; g) ruptura do mesentério; h) lesões produzidas por “sprayes” irritantes do tipo gás lacrimogênico.

      B.4 – lesões raquimedulares: a) fraturas e luxações de vértebras; b) lesões medulares.

Elementos valorizados no diagnóstico de execução sumária

As medidas para tal diagnóstico devem ser sempre tomadas quando diante de morte controvertida cujos aspectos e circunstâncias apontam para o exagero e a brutalidade; quando a vítima esteja envolvida em casos de comovam a opinião pública; quando esteja sob custódia policial ou judiciária; ou quando o modus operandi seja reconhecida como uma prática que tem como finalidade obstruir as investigações em curso.

Os elementos mais importantes são:

1. A perícia no local dos fatos. A Perícia Criminal deve  coordenar as atividades investigatórias a serem realizadas no local dos fatos, pela importância que se reveste uma perícia cuja causa jurídica de morte e suas circunstâncias devem ser avaliadas com muito critério. Devem ser valorizadas as lesões encontradas, a posição do corpo, as condições de suas vestes, assim como o lugar onde a vítima foi encontrada ou onde se presuma que ela esteve antes da morte.

           

Nestes locais recomenda-se a coleta de sangue, pêlos, fibras e ainda a preservação e coleta de moldes das marcas de calçados, de veículos ou de qualquer outra impressão que tenha caráter probatório. Deve-se também procurar nestes locais a presença de projeteis e cartuchos de arma de fogo, além das possíveis impressões digitais.

Tudo isto tem como projeto a identidade das pessoas que se encontravam no local dos fatos, seus atos e até a circulação da vítima e de seus agressores. São procedimentos mínimos possíveis de serem realizados sem meios sofisticados e em qualquer localidade. Devem tomar-se fotografias em cor, pois estas podem se mostrar com mais detalhes. Estas fotos devem ser dos locais internos e externos, do cadáver e de todas provas físicas.

É importante que a perícia criminalística apresente um relatório do conjunto dos eventos tenha uma visão entre os atiradores e vítimas e as lesões observdas como contribuição à confirmação ou não de uma morte por execução sumária.

2. O número de tiros. As mortes por execução sumária, em quase sua totalidade, são produzidas por arma de fogo e suas vítimas executadas com elevado número de disparos por vítima, numa média de cinco a seis, em geral com armas diversas e  de calibres diferentes.

3. As regiões atingidas. Sempre em tais tipos de morte as regiões eleitas para os disparos são a cabeça e outras regiões mortais como a precordial. Ou ainda lesões encontradas na região posterior do tronco. Outra forma de lesão que deve ser bem pesquisada é a encontrada nos braços e mãos conhecidas como “lesões de defesa”. Estas lesões devem ser descritas com todas as suas características e quando se tratar de lesões produzidas por projeteis de arma de fogo a descrição deve ser a mais detalhada possível no sentido de facultar a identificação dos ferimentos de entrada e saída, a distância dos disparos e a sua angulação. 

4. O trajeto dos projeteis. Este é um dado muito importante pois isto pode permitir avaliar como se encontravam a vitima e o seu autor ou seus autores no momento dos tiros. A determinação do trajeto de um projétil de arma de fogo, com aproximado grau de certeza, é feita a partir de pontos fixos e corretamente estabelecidos. Quando o tiro é transfixante teoricamente o trajeto seria uma linha reta ligando o ferimento de entrada ao ferimento de saída. Estabelecendo-se com rigor os ferimentos de entrada e saída e utuilziando o exame interno para rastrear o projetil pode-se concluir se seu trajeto foi em linha reta, de cima para baixo, de baixo para cima, da esquerda para direita, da direita pa esquerda, de diante para trás ou de trás para diante, inclusive determinado-se o angulo de abertura deste trajeto com o plano horizontal do corpo.

A direção tomada pela bala em seu trajeto e as circunstâncias em que se deu o fato, podem permitir avaliar se a vítima estava em pé, sentada, de joelhos ou deitada em posição dorsal ou ventral na hora em que foi atingida. Isto explicado pela angulação mais ou menos acentuada do trajeto da bala quando penetra no corpo da vítima.

5. A distância dos tiros. Este é também um dos elementos de muita importância no estudo pericial da execução sumária, tendo em conta que na maioria destes casos o tiro é dado a curta distância. Suas características dos ferimentos de entrada por bala são: forma arredondada ou ovalar, orla de escoriação, bordas invertidas, halo de enxugo, halo de tatuagem, orla de esfumaçamento, aréola equimótica, zona de compressão de gases e zona de queimadura (quando apresenta esta última característica chama-se a queima-roupa).

6. O calibre das armas. Outro fato muito comum nas mortes por execução sumária é a participação de mutos agentes e a multiplicidade de armas de modelos e calibres diferentes. Este estudo será feito pelos setores de criminilistica ligados à balistica forense.

7. A autenticidade do projetil. O estudo comparativo do prjetil com a arma suspeita é de indispensável valia para se determinar a arma que disparou. No entanto é necessário saber se aquele prtjetil mandado a exame de fato penetrou no corpo da vítima. Para tanro não se pode dispensar a pesquisa de micro-vestígios orgânicos encontrados neste projetil erxaminado. 

Ao penetrar na intimidade dos tecidos o projétil leva consigo inúmeras micro-partículas orgânicas capazes de permitir o diagnóstico destas estruturas permeadas, como fragmentos de pele, ossos, músculos e de vísceras e sangue. Tais estruturas podem ser identificadas pelos diversos processos histológicos e pelos reagentes conhecidos. Atualmente com as técnicas em DNA avançou-se muito na questão da intimidade da vítima com o projétil.

Recomendamos para este fim retirar com muita delicadeza a matéria orgânica do projétil que se alojou ou traspassou o corpo e colocar este material dentro de um recipiente contendo pequena quantidade de soro fisiológico. Ou retirando-se pequenos fragmentos do material existente no projétil, esmagando-o suavemente entre duas lâminas, e depois as enviando ao laboratório para a devida preparação e leitura.           

8. As lesões tegumentares.  Deve merecer a atenção a presença ou ausência de outras lesões tegumentares na vítima no sentido de afirmar ou negar a possibilidade de confronto corporal.

9. As lesões imobilizadoras. A presença de uma uma lesão imobilizadora na vítima, como uma fratura exposta da perna, pode permitir a hipótese de que ela estava imobilizada a partir daí, vindo depois o chamado tiro ou tiros fatais. Pode-se admitir, a partir do trajeto dos outros projeteis que o “tiro de misericórdia” foi dado com a vítima imobilizada ao chão. Assim, o conjunto de lesões externas e internas estudado no cadáver da vítima pode facultar o entendimento de que houve ou não uma seqüência de atitudes que possibilitariam a imobilização da vítima até a deflagração do tiro letal.

10. A ausência de indicadores de condutas defensivas das vítimas. É comum dos casos constatados como execução sumária não serem encontradas lesões que denotem ter a vítima esboçado uma resistência, seja pelas chamadas “lesões de defesa” (mãos e antebraços) seja pela reação de não sujeitar-se à captura (hematomas, equimoses e escoriações de arrastão).

11. O sequenciamento dos tiros.  Uma caracteristica que pode estar presente nestas formas de morte é a seqüência de orifícios de entrada de projétil de arma de fogo que segue uma linha de mesma direção  de mesma distância ou não entre si por disparos do tipo rajada.

Mortes relacionadas a álcool e drogas

  Não são raras as mortes verificadas durante ou logo após (4 a 6 horas) a detenção de indivíduos sob efeito de drogas (cocaína e anfetaminas)  e bebidas alcoólicas. Um dos motivos apontadas é a produção de catecolaminas liberadas após o estresse ou o enfrentamento físico que se juntam à ação daquelas substâncias estimulantes, além da diminuição do nível sanguíneo de potássio produzindo as arritmias e a morte.

 A psicose tóxica ou síndrome confusional aguda ou delírio agitado é uma das causas mais comuns de morte nas primeiras horas de detenção de indivíduos drogados. Esta é uma situação de urgência neurológica que impõe internamento e tratamento hospitalar. Estes pacientes podem também desenvolver a coagulação intravascular disseminada.

 Antes de morrer estes eles apresentam comportamento estranho, violento e paranóico, além de desorientação de tempo e espaço, alteração da memória, alucinações e crise de pânico.

 Na necropsia verifica-se a temperatura do corpo muito elevada e persistente por muitas horas, o coração quase sempre aumentado de peso e volume. Pode-se comprovar alterações neuroquímicas do cérebro através dos receptores de dopamina e de opiáceos, pesquisa esta que deve se feita antes de 12 horas após morte

Respostas aos quesitos do laudo

 No que diz respeito ao quesito “Se a morte foi produzida por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou por outro meio insidioso ou cruel” deve, nos casos positivos, ser respondido de forma especificada, ficando na descrição do laudo bem claras as razões de tal confirmação.

Nos casos de tortura a base da conclusão está nas lesões internas e externas, seja nos seus resultados, seja na sua forma de produzi-las. O meio insidioso seria aquele que  se manifesta pela forma de dissimulação capaz de encobrir a prática criminosa e impedir a defesa da vítima. O uso do veneno é um exemplo desta ação dissimulada. E meio cruel aquele em que o autor procura muito mais provocar o sofrimento físico ou psíquico da vítima do que propriamente sua morte. Neste particular devem-se considerar muito mais as regiões atingidas, as características das lesões e o meio ou instrumento causador das lesões. A gravidade das lesões e sua multiplicidade, por si sós, não caracterizam o meio cruel.

Nos casos em que não estejam evidentes  tais manifestações (tortura e meio insidioso ou cruel), recomendávamos o cuidado de responder àquele quesito usando as expressões “sem elementos de convicção” ou “sem meios para afirmar ou negar”, deixando-se para outros exames complementares, inclusive o laudo da perícia criminalística, uma definição mais exata. Ainda mais quando a morte se deu de forma suspeita ou duvidosa. Enfim, só responder afirmativamente quando se tiver a plena certeza de que há lesões tipicamente produzidas por aqueles meios.  Nunca responder “não”. Há muitas formas de crueldades e torturas que não deixam evidências.

Agora, o  Protocolo de Istambul (Manual para Investigação e Documentação Eficazes da Tortura e de outras Formas Cruéis, Desumanas ou Degradantes de Castigo ou Punição), apresentado ao Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, em 9 de agosto de 1999, admite que o examinador  possa usar determinados termos em suas conclusões como:

1 - Inconsistente: a lesão não poderia ter sido causada pelo trauma descrito;

2 - Consistente: a lesão poderia ter sido causada pelo trauma descrito, mas não é específica dele e existem muitas outras causas possíveis;

3 - Altamente consistente: a lesão poderia ter sido causada pelo trauma descrito e são poucas as outras causas possíveis;

4 - Típica de: esta lesão é geralmente encontrada em casos desse tipo de trauma, mas existem outras causas possíveis;

5 -  Diagnóstico de: esta lesão não poderia ter sido causada em nenhuma outra circunstância, a não ser na descrita.

Tomando por base as sugestões do Grupo de Trabalho “Tortura e Perícia Forense” criado pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, adaptando o Protocolo de Istambul a nossa realidade para o “Protocolo Brasileiro de Perícia Forense no Crime de Tortura”, concordamos com a apresentação dos seguintes quesitos nos exames onde há suspeitas de tortura ou outro procedimento cruel, desumano ou degradante, nos seguintes termos:

1. Há achados médico-legais que caracterizem a prática de tortura física ou de outro meio cruel, desumano ou degradante?

2.  Há achados médico-legais que caracterizem execução sumária?

3. Há evidências médico-legais que sejam indicadoras ou sugestivas de ocorrência de tortura, meio cruel, desumano ou degradante e de execução sumária contra o examinado que, no entanto poderiam excepcionalmente ser produzidos por outra causa?

4. Há evidências médico-legais que sejam indicadoras ou sugestivas de ocorrência de tortura, meio cruel, desumano ou degradante e de execução sumária  contra o examinado que, no entanto poderiam excepcionalmente ser produzidos por outra causa?

Este último quesito, quando afirmativo, deixa claro que o perito apenas está afirmando que existem evidências sugestivas e indicadoras de tortura, meio cruel, desumano ou degradante e de execução sumária, o que pode possibilitar ao juiz, com existências de outras provas e de acordo com seu livre convencimento, tirar suas conclusões.

Protocolo de modelo de necropsia em mortes em clausura

Entendendo-se que toda morte ocorrida em delegacias, presídios e órgãos congêneres são de “causa suspeita”, elas estão sujeitas à necropsia. O ideal seria que nos casos de suspeita de tortura ou execução sumária a perícia fosse realizada por peritos especificamente preparados para exames nestas circunstâncias e capazes de seguir um protocolo mínimo para assegurar uma perícia sistemática no sentido de facultar uma idéia positiva ou negativa em torno do fato se quer apurar.

Como toda morte de causa controvertida necessita de esclarecimentos exige que os  exames sejam realizados de forma minuciosa. A finalidade de uma perícia feita para tais fins é  reunir o maior número de informações para assegurar a identificação do morto, a determinação precisa da causa mortis e da causa jurídica da morte e a descrição e caracterização das lesões violentas.

Recomenda-se, além do que é praxe nas necropsias médico-legais:

a) Anotar a hora do início e do término das perícias;

b) Proteger, analisar e encaminhar as vestes para os devidos exames em laboratório sob custódia de pessoa responsável.

c) Colocar o cadáver em sacos apropriados.

d) Guardar o cadáver em lugar refrigerado para evitar alterações e possíveis comprometimentos das provas;

e) Se o morto esteve internado antes da morte, solicitar os dados de registros relativos à admissão, evolução, medicação, ao seu tratamento, exames radiológicos e laboratoriais complementares e causa mortis.

f) Proteger as mãos com sacos de papel ou plástico, que se anote a hora do início e do término da perícia e que se fotografe em cores as lesões mais significativas. Além disso, que se fotografe  a seqüência do exame interno e externo, tendo o cuidado de usar escalas, número e nomes para identificação do caso. Fotografar também os dentes mesmo que se tenha a identificação por outros métodos.

g} Valorizar o exame externo do cadáver que em muitos casos é a parte mais importante. O mesmo se diga quanto a valorização da temperatura, do estado de preservação, da rigidez e dos livores cadavéricos.

h) Tendo em conta as execuções sumárias superarem em muito os casos de tortura, os ferimentos por projéteis de arma de fogo devem ser bem descritos quanto à forma, direção,  trajeto, inclinação e distância de tiro.

i) Recolher amostras de vísceras para exame toxicológico e guardar parte das amostras para  possível reexame. Recolher amostras de sangue de pelo menos 50ml de um vaso subclávio ou femoral.

j) Realizar incisões ao longo das regiões dorsais, lombares e nádegas na procura de lesões profundas.

l) Examinar as extremidades dos braços e das pernas em procura das chamadas “lesões de defesa” e das lesões produzidas por tortura nos pés, nas mãos, joelhos e parte posterior das pernas.

m) Examinar bem a face com destaque para os olhos, nariz e ouvidos.  Examinar o pescoço externamente em todos seus aspectos. 

n) Examinar os genitais e em casos suspeitos de violência sexual examinar todos os orifícios, recolher pelos pubianos, secreção vaginal e anal para exames em laboratório.

 o) Fotografar fotografe em cores das lesões mais significativas. Além disso, que se fotografe  a seqüência do exame interno e externo, tendo o cuidado de usar escalas, número e nomes para identificação do caso. Fotografe-se também os dentes mesmo que se tenha a identificação por outros métodos.

p) Descrever em detalhes os projéteis de arma de fogo quanto à forma, direção, trajeto, inclinação e distância de tiro e, se possível, estabelecer a determinação da ordem dos ferimentos.

q) Trocar o maior número de informações com a criminalística.

r) Extrair amostras de tecido no trajeto da  ferida  e micro-vestígios biológicos dos projéteis para exame microscópico.

É muito importante que o cadáver fique à disposição da instituição médico-legal pelo menos por 12 horas.

Conclusão

Diante do exposto, seria interessante fossem consideradas as seguintes medidas:

1. Considerar como morte sob custódia toda aquela que ocorre em pessoas privadas de liberdade e sobre a qual se pode aventar uma situação de morte violenta.

2. Recomendar que tais mortes tenham obrigatoriamente uma investigação criminal e que se inicie com a competente necropsia.

3. Criação de um Registro Nacional de Morte sob Custódia para se ter a extensão e acompanhar sua incidência, suas características e suas causas.

4. Estimular os órgãos de direitos humanos, governamentais ou não governamentais, no sentido e incluírem em seus programas e projetos o tema “morte sob custódia”

5. Estimular a capacitação de médicos legistas e peritos criminais no sentido de aperfeiçoarem seus conhecimentos diante de tais óbitos.

 

 


 

 

NOTAS:

[1]  L. Danielsen, Mudanças na pele após tortura, Tortura (Supl. 1, 1992:27-28).

[2] O. V. Rasmussen, Aspectos Médicos da Tortura, Boletim Médico Dinamarquês (1990, 37 Suplemento 1:1-88).

 


 

* Profesor Convidado no Curso à distância em Medicina Forense da Universidade de Valência (Espanha).

E-mail: gvfranca@uol.com.br

 


 

Índice

HOME