Derecho y Cambio Social

 
 

 

DO TRABALHO TERCEIRIZADO:
POSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DA SUA FUNÇÃO SOCIAL NA NOVA DINÂMICA EMPRESARIAL?

Lourival José de Oliveira*


 

Resumo

A reestruturação pós-fordista, envolvendo novas tecnologias, novos métodos de gestão da produção, novas formas de utilização da força de trabalho e a transformação do Estado, com novos modos de regulação da atividade empresarial, são elementos que acabam delineando a chamada reestruturação produtiva.  Nesta nova ordem, a terceirização da força de produção pode representar a dispersão do núcleo empresarial, desagregando trabalhadores e limitando a sua força de representação. No entanto, dentro da mesma reestruturação produtiva desponta a empresa como instituição, tomando a terceirização nova compreensão a partir do momento em que participa de uma estrutura horizontalizada, com a participação efetiva dos trabalhadores nos seus destinos, tendo como resultado a socialização da empresa, que acaba expandido e gerando contribuições para toda a coletividade externa.

Abstract

The post fordist restructuration, involving new technologies, new methods of production manegement, new ways of using the work power and the transformation of the State, with new ways of the entrepreneurial activity regulation, are elements that outline what we know as productive restructuration. In this new order, the subcontract of the production power can represent the spread of the entrepreneurial center, disaggregating workers and limiting their representation power. However, in the same productive restructuration rises the company as institution, having the subcontract a new comprehension, from the moment it takes part of a horizontalized structure, with the effective participation of the workers in their destines, having as a result the socialization of the company, which grows and produces contributions for all the external collectivity.

 

Palavras chaves: terceirização; reestruturação produtiva; a instituição empresarial; estrutura horizontalizada.

 

1.0-            Introdução

A discussão em torno da terceirização tem obtido grande importância, principalmente por parte  dos defensores dessa forma de desconcentração de trabalho e de flexibilização, que apontam para  a produção de bons resultados por parte das empresas que a adotaram. Trata-se  de uma técnica de organização empresarial, ao ponto de ser encontrado vários estudos sobre suas vantagens e desvantagens.

Para Pedro Vidal Neto:

                           A terceirização pode aplicar-se, portanto, quer à produção de bens, é dizer de componentes do produto final, quer à execução de serviços, mas somente se caracteriza quando inserida como etapa  regular  no processo de produção de uma empresa, poupando-a de obtê-los com a utilização de seus próprios equipamentos e de seu próprio pessoal. Não se perfaz pelo simples cometimento da execução de certas tarefas, a terceiros, de modo eventual e esporádico.[1]

Não obstante os defensores do processo de terceirização, têm-se em conta também os resultados não muito vantajosos a ela atribuídos. A título de exemplo, vale citar  o desastre ocorrido em uma das plataformas marítimas da Petrobrás de extração de petróleo denominada de P-36.[2] Naquela oportunidade descobriu-se que uma grande percentagem dos trabalhadores que exerciam a função de petroleiros estavam vinculados à empresas intepostas, empresas de terceirização, apontando-se que as empresas fornecedoras de mão-de-obra não cuidavam suficientemente dos treinamentos necessários dos seus petroleiros, podendo esse fator ter contribuído para o acidente ocorrido.

Em face das denúncias, recentemente a Petrobrás assumiu  o compromisso de redução do trabalho terceirizado nas plataformas exploradoras de petróleo[3].

Por outro lado, a terceirização no momento atual que se procede a chamada reestruturação produtiva já não pode ser mais estudada nos termos simplistas apresentados no final da década de 80 e parte da década de 90, não se tratando mais da execução de certas tarefas esporádicas ou atividades que não estão incluídas no núcleo empresarial.

Não se pretende neste estudo caminhar para algo casuístico, no sentido de destacar vantagens, desvantagens da terceirização ou as variadas formas de terceirização. Pretende-se explicar esse fenômeno, que está ligado à questão histórica primeiramente e à própria reordenação dos diferentes modos de produção, concebendo-a como fator de reorganização estrutural produtiva com uma evolução própria, que começou no Brasil pela sua permissão para as chamadas atividades meio e no momento atual, em alguns setores produtivos, foi introduzida na consecução das próprias atividades fins da empresa.

2.0-            Da questão histórica nas relações de trabalho.

O Direito do Trabalho não pode ser estudado sem levar em consideração os variados modos de produção, que trouxeram uma gama de variações na organização produtiva, tendo como conseqüência as diversas formas com que o homem relacionou-se com o seu meio.

 Modo de produção é a própria relação do homem com a natureza, levando-se em conta os mecanismos de produção, as variadas técnicas empregadas para a produção do trabalho, as formas de prestação de trabalho e o próprio produto obtido dessas relações.

A contar principalmente dos Estados Unidos, iniciou-se o desenvolvimento do chamado modelo fordista de produção, cuja base era um conjunto de ações, que iam desde o controle do trabalho até a criação de hábitos de consumo. Significou a busca do pleno emprego, com a conseqüente integração da população na economia de mercado, de que resultaria uma crescente acumulação de riquezas e o desenvolvimento das forças produtivas, com a intervenção reguladora do Estado financiador.

Na década de 90 o mundo passou por rápidas transformações  no modo de produção, fazendo com que a vida tomasse uma dimensão planetária e o Estado passasse a representar um outro papel, deixando por assim dizer de ser um Estado financiador ou centralizador e passando para o papel de regulador, sendo as funções do Estado nacional ocupadas por organismos internacionais, ao ponto de poder ser afirmado que o modelo anterior , centralizador, de Estado passava pela seguinte fórmula: industrialização-urbanização- militarização- concentração econômica-integração social-consumo em massa. A nova fórmula pode ser representada como: acumulação com domínio supramercado - não intervenção estatal-domínio do coletivo através da fragmentação da produção e dos interesses dos trabalhadores.

Segundo   Reginaldo Melhado:

                        O apogeu do desenvolvimento tecnológico e das lentas e subliminares transformações no  plano da economia, com a empresa capitalista pouco a pouco sobrepujando a oficina artesanal, coincidem com o paroxismo da crise do antigo remímen político e econômico feudatário. Não obstante, os ideários da revolução burguesa restam alijados da fábrica capitalista, no que tange à conformação organizativa da produção e ao controle do trabalho.[4]

Dentro da nova estrutura, aqui chamada de  globalizante, tem-se  a chamada fragmentação do coletivo, com diferentes resultados, de acordo com o local da incidência e o setor de produção em que se operam as políticas globalizantes. Para visualizar melhor essas variáveis ocorridas nos  modos de produção, vale citar o setor automotivo.

 

As grandes empresas automotivas passaram a adotar um conjunto de estratégias de produção que atingiram o mundo do trabalho. São estratégias tidas como de avanços qualitativos e quantitativos de produção, com inovações tecnológicas e organizacionais, atingindo o próprio núcleo da produção. Trata-se de um complexo de ações que podem ser resumidas em um processo de reestruturação produtiva, com a criação de novas plantas organizacionais, com determinados padrões de flexibilização do trabalho, permitindo que empregados de várias empresas diferentes, que antes eram empresas fornecedoras simplesmente de peças para a montadora, se associassem e criassem novos métodos de gerenciamento e de organização de produção.

Este novo complexo produtivo gerou a chamada descentralização produtiva, caracterizada principalmente pela chamada terceirização em um segundo estágio de desenvolvimento. Na medida em que se constituiu uma nova rede de produção, atendendo-se aos princípios da racionalização da produção e das novas técnicas de gestão da produção, houve a necessidade da transferência de atividades produtivas para outras empresas, mudando conseqüentemente a concepção do chamado espaço-território da produção. Antes a terceirização atingia os serviços de apoio à produção, como os serviços de limpeza, transportes, vigilância e etc. A contar dessa nova reestruturação produtiva atingiu-se os trabalhos ligados a atividade fim da empresa, vinculados aos principais setores da produção, com trabalho qualificado, oferecendo uma nova divisão do processo produtivo aliado à manutenção  do nível tecnológico.[5]

Enquanto resultados desse processo de desconcentração na produção, constituindo uma nova terceirização, podem ser observados os seguintes: a aproximação geográfica das empresas de terceirização com a empresa tomadoras; a própria desconstituição da empresa centralizadora, passando as antigas empresas de terceirização a ocuparem o núcleo da produção;[6] a dificuldade de se ter o conceito de categoria profissional diante desse novo quadro de inter-relacionamento empresarial e de trabalho; e, a geração de um novo coletivo.

E’ justamente esse novo coletivo no ambiente de trabalho que  apresenta-se enquanto carente de uma melhor reflexão, principalmente em torno da nova noção que se deve ter sobre esse novo ambiente empresarial.

3.0-            A terceirização e o novo coletivo empresarial.

A terceirização, por pelo menos duas décadas, passou a ser tida como um dos elementos de flexibilização do direito do trabalho. Uma verdadeira estratégia de  “modernização” para fins de ser alcançada a competitividade empresarial.

No Brasil inexiste até o atual momento uma legislação própria que regule a terceirização, com exceção dos serviços de vigilância e o trabalho temporário.[7] O Enunciado nº 256/86[8] do Tribunal Superior do Trabalho (TST) foi a primeira referência importante sobre ações judiciais. Com o Enunciado nº 331/83 do T.S.T., estabeleceu-se que a contratação de mão-de-obra por empresa interposta era ilegal, com exceção do trabalho temporário, de serviço de vigilância, conservação e limpeza e aqueles serviços especializados ligados à atividade-meio da tomadora. Criou-se assim a discussão sobre os critérios a serem adotados para se ter o conceito de atividade meio e de atividade fim, ressaltando-se que é essencialmente difícil, principalmente em face do processo de reorganização produtiva , que com as novas formas de gerenciamento empresarial atinja-se  pontos de dificuldade de  identificação da atividade meio e da atividade fim em dado contexto empresarial.

Em várias situações, a expansão do processo de terceirização acabou inserindo-se nos planos gerenciais de determinadas organizações produtivas, levando à redução de serviços, à desverticalização empresarial, à composição de verdadeiros consórcios que escapam à visão simplista da caracterização de atividade meio ou atividade fim, justamente porque os conceitos transcritos estão inseridos em dada organização verticalizada, onde permanece  o chamado núcleo empresarial, com atividades acessórias circundando este núcleo. A partir do momento em que as atividades ou serviços antes acessórios acabam por compor o núcleo, cresce a dificuldade de se localizar as atividades meio e as atividades fim.[9]

Esta nova concepção de terceirização acaba levando a sérias indagações. Dentre elas tem-se: a organização sindical dentro deste novo contexto; a questão salarial, principalmente a equiparação ou não das remunerações dos empregados vinculados às demais empresas que participam conjuntamente do núcleo empresarial; a qualificação profissional e a solidariedade empresarial diante de possíveis ações trabalhistas promovidas pelos empregados, em relação às várias empresas que se encontram agrupadas na produção comum.

No que diz respeito à organização sindical especialmente, já foi examinado em obra recente a questão do “núcleo de representação direta”, ficando assim demonstrada a questão:

                        A grande reforma ou reestruturação do sindicalismo no Brasil deve passar pela representação efetiva dos trabalhadores nos locais de fábrica, através dos núcleos  de representação direta. Esses núcleos  seriam pontos de aglutinação de trabalhadores dentro da fábrica, podendo, ou não, vir a constituir-se em pessoa jurídica de direito privado. A necessidade  de um ou mais núcleos na mesma empresa estaria dependente da necessidade e voluntariedade dos trabalhadores, de acordo com o quadro organizacional da empresa, a associação dessa empresa com outras empresas. Seria a participação efetiva dos trabalhadores, opinando, reagindo, integrando-se à atividade empresarial, sem se despir dos seus interesses próprios e individualizados.

                        Os núcleos de representação seriam caracterizados como política de trabalhadores e de empresa interagindo internamente, de forma coordenada e, após, agindo e recebendo da coletividade externa os reflexos das ações empregadas, de maneira a fazer que a atividade empresarial, como um todo, esteja apta para atender a esta mesma comunidade.[10]

No que tange à garantia para os empregados das diversas empresas participantes do núcleo, na hipótese da busca da responsabilização, parece que não há dificuldade em se concluir pela solidariedade entre as empresas com relação a todos os empregados, diante da concentração das atividades havidas. Há de se reconhecer que efetivamente pode-se gerar até uma maior garantia para os empregados diante do desenvolvimento da terceirização em face da reorganização produtiva, levando-se em conta que as empresas apresentam-se com maior idoneidade, ganhando-se uma espécie de fusão administrativa.

No caso da qualificação profissional, podem ser vislumbradas duas situações: a trazida com a tragédia da plataforma P-36, que em parte foi atribuída a responsabilidade às empresas de terceirização, que não qualificavam os seus trabalhadores de forma satisfatória e no caso da nova terceirização em face da reestruturação produtiva, em que as empresas que se apresentam integradas possuem idoneidade suficiente e comprovada para participarem do consórcio produtivo, inclusive com políticas de recursos humanos e níveis salariais idênticos.

Como alinhavar a reestruturação produtiva, o crescente fenômeno da terceirização e a responsabilidade social empresarial?

4.0-            A terceirização e a responsabilidade social empresarial.

A responsabilidade social da empresa está vinculada diretamente ao conceito de cidadania aplicada ao contexto empresarial. Em outras palavras, trata-se de articular os projetos empresariais com os da coletividade. Para a sua concretização, a empresa deve estar voltada para a construção de uma realidade social, percebendo as necessidades do mundo e agindo de forma a fazer com que  o seu desenvolvimento se realize de uma forma sustentada, não pautado somente em valores econômicos.

Em outras palavras, dentro do projeto individual da empresa deve estar contido a sua relação com o contexto coletivo, partindo de uma ética de responsabilidade, em que o seu crescimento deve estar respaldado com o crescimento da sociedade, especificamente dos indivíduos ( trata-se do plano coletivo de desenvolvimento ).

Segundo Evaristo de Morais Filho, tratando sobre a função social da empresa, ensina:

                        Mais tarde a sociologia industrial e a sociologia do trabalho, nos Estados Unidos, na França, na Inglaterra, haveriam de retomar a empresa para tema de seus estudos e pesquisas, considerando-a como sistema social, não só em sua organização interna, como igualmente em suas relações com a sociedade global em seus efeitos sobre o nível de vida, a concentração ou dispersão  populacional, sobre a vida doméstica, cultural e mesmo política da comunidade circundante. E aqui já se manifesta de maneira flagrante a imensa função social da empresa que não é uma ilha perdida e isolada em seu tempo e em seu espaço.  Pelo contrário, faz parte de um todo global inexplicável, nacional e internacional. Com os estudos da sociometria, das relações humanas, da organização e da administração, hoje comuns e necessários, alcançou a empresa a posição de um dos grupos mais bem estruturados e organizados para a pesquisa sociológica.[11]

                       

Dentro de uma visão meramente empresarial, econômica, o elemento humano não é predominante, diante da possibilidade de um lucro e mesmo quando toma alguma importância, no caso de a empresa possuir trabalhadores qualificados de difícil substituição, ainda assim, o que prevalecerá é a busca do lucro através desses trabalhadores.

Para o  direito do trabalho a situação não funciona assim.  O seu interesse maior  é o homem, voltando-se principalmente para as relações que se estabelecem entre as pessoas. No caso, o interesse social da empresa deve ser em um primeiro momento  com o seu ambiente interno. A melhoria das condições de vida para a sua comunidade interna. Num segundo momento é fazer com que a melhoria das condições de vida alcance o ambiente externo, vindo daí a compreensão da sua função social.

A função social não está restrita apenas à empresa. Segundo o artigo 170 da Constituição Federal:

                          A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: II- propriedade privada; III- função social da propriedade; V – defesa do consumidor; VIII – busca do pleno emprego.

Não poderia ser diferente em relação à empresa, considerada parte da sociedade, que tem como obrigação empregar suas forças em favor do coletivo social. A cultura de uma organização moderna, de uma empresa cidadã, tem de ser de integrar-se ao espírito da coletividade, ligando-se a outros sistemas sociais, acompanhando as conquistas tecnológicas, culturais, científicas, políticas e administrativas. Em seus novos  comportamentos coletivos, a empresa abre-se para a construção de um novo meio ambiente de trabalho, sujeitando-se às leis sociais, desempenhando um papel de valorização do cidadão, com o investimento em novas tecnologias, a adoção de novas formas de gerenciamento, visando o aumento da produtividade e do bem estar dos empregados, sempre engajada com o compromisso social de contribuir com o desenvolvimento de toda a sociedade de maneira duradoura. Sob esta ótica é que devem ser observadas as novas formas de reestruturação produtiva, principalmente a questão da terceirização enquanto fazendo parte desta reestruturação.

5.0 – A terceirização, reorganização produtiva  e a empresa social.

A tendência das empresas modernas deve ser a de organizar o processo produtivo com base na iniciativa dos seus empregados  e na capacidade para eliminar custos, ao mesmo tempo em que procuram atender a dinâmica e a necessidade do mercado, normalmente produzindo em lotes de pequena dimensão e mantendo baixos estoques. A característica central e diferenciadora do chamado método japonês,  foi abolir a função de trabalhadores profissionais especializados para torná-los especialistas multifuncionais, ou seja, a organização da produção em células e não em linhas rígidas.

Essa nova forma de gerenciamento, interagindo-se empresas em uma escala evoluída de terceirização necessita da estabilidade do seu pessoal, elemento extremamente importante para a implementação desse modelo. Nessas condições, está se consolidando um sistema de produção planejado, sob a premissa do controle relativo do mercado pela grande empresa. Assim, o que é importante nesse modelo é a "desintegração vertical da produção" compondo um conjunto de empresas, substituindo a integração vertical de departamentos dentro da mesma estrutura empresarial, normalmente burocratizada.  Também é provável que gere maiores incentivos e mais responsabilidade para os empregados, sem necessariamente   alterar o padrão de concentração do poder industrial, da inovação tecnológica, do poder financeiro e do controle do negócio propriamente dito.

A habilidade organizacional em aumentar as fontes de conhecimentos torna-se a base das inovações anunciadas, exigindo estabilidade da força de trabalho na empresa, porque apenas dessa forma é racional que um indivíduo transfira seus conhecimentos para a empresa, e a mesma difunda conhecimentos explícitos entre seus trabalhadores. Esse mecanismo aparentemente simples envolve uma transformação profunda das relações entre os gerentes e os trabalhadores, alterando a ordem de poder, com o empregado participando da vida empresarial de forma interativa, com a finalidade de alcançar internamente a valorização do trabalhador, a sua qualificação, a sua participação, desmistificando-se o aspecto privatístico que cercava o ambiente empresarial. Dessa maneira tem-se a chamada empresa social que deverá exportar esses conhecimentos e a participação para outras esferas de poder.

Neste contexto, tem-se a participação do Estado enquanto fonte reguladora das relações de trabalho e ao mesmo tempo da criação de um campo autônomo de participação do empregado nas atividades empresariais, que irá gerar um espaço reservado para os trabalhadores sem que com isso precise desregulamentar as relações de trabalho, eliminando as normas protetivas mínimas, principalmente para aquela outra gama de empregados que não possuem ainda o privilégio de trabalharem neste novo conceito de empresa ou de atividade empresarial, apenados pelo controle rígido, verticalizado e com pouca qualificação no trabalho.

Trata-se em outras palavras da implementação da chamada autonomia privada coletiva dentro do novo contexto empresarial, onde principalmente a terceirização alcançou diferente grau de desenvolvimento, passando pelo processo de socialização da empresa, com a participação efetiva do trabalhador.

Portanto, é possível pensar nas novas formas de terceirização, passando pelo estudo do processo de reorganização produtiva, sem que com isso seja gerada necessariamente a desagregação dos trabalhadores. De forma contrária, pode ser obtida a  efetiva inclusão deles no processo de produção, de participação empresarial, onde a reorganização produtiva poderá em muito contribuir para o alcance desse resultado.

6.0 – A reforma trabalhista e a garantia do processo de socialização nas relações de trabalho.

Quando do surgimento do direito do trabalho, o crescimento da produção implicava necessariamente na geração de novos postos de trabalho. Nos dias atuais, com a produção devidamente globalizada, o crescimento econômico não quer significar necessariamente no aumento dos postos de trabalho. Muito pelo contrário, pode resultar na deterioração ou precarização dos postos de trabalho existentes, onde a cada dia tem-se com maior intensidade o aumento do nível de exclusão social.

O Estado por sua vez, nos dias atuais, não detém mais a força necessária para impedir que a exploração e a exclusão social deixem de acontecer. Inclusive, o que prepondera são as propostas de não intervenção do Estado no domínio econômico, de forma  a deixar que as forças econômicas possam calibrar por si próprias o ambiente de trabalho e por conseqüência as condições de vida dos trabalhadores.

Por conta disso, a luta não mais é travada entre o capital e o trabalho. Nesta nova organização, o capital já venceu o trabalho a muito tempo. Deve-se assim insurgir-se na participação do empregado nesta nova ordem produtiva. A forma integrativa com participação do trabalhador nos destinos da empresa  deve preponderar se comparada á política de confronto.

Desta maneira, o que se propõe, com amparo na  premissa da socialização da empresa, é ter o direito do trabalho, em seu processo renovador, baseado em outras premissas. Para tanto, vale a defesa de alguns pontos de extrema importância. São eles: a proteção contra a informatização e a automação abusiva, estabelecendo-se procedimentos que regulem os processos de automação, a fim de que a eliminação dos postos de trabalho não ocorra de forma inconseqüente. Juntamente  com essa proteção, a defesa da requalificação da mão-de-obra que será eliminada, através de incentivos fiscais e reintegração em postos de serviço com o apoio direto da empresa geradora das demissões; a implementação de uma legislação própria de direito à informação, de forma a fazer com que os trabalhadores de dada empresa tenha efetivamente condições de conhecer a real situação econômica, administrativa e gerencial da empresa; o impedimento de práticas desleais de negociação e de contratação, de forma a não criar a discriminação no ambiente de trabalho, com medidas repressivas e desmotivadoras; a fixação de metas sociais para serem alcançadas pelas empresas, que não sejam  simplesmente na busca de doações com vistas a propagandas publicitárias.

Nota-se que são outros os ideais perseguidos pelo direito do trabalho, que não mais estão circunscritos na proteção das garantias mínimas do trabalho na relação de emprego. Muito pelo contrário, estão voltados a incentivar a efetiva participação social da empresa no plano interno e externo  na comunidade em que está inserida, através de projetos de reestruturação produtiva pautadas na valorização do homem.

7.0 – Conclusão

O Estado nacional, neste momento, não poderá ser retirado da área de regulação entre o capital e o trabalho. O direito do trabalho deve passar por uma mudança de concepção, deixando a visão dualística e buscando fazer com que o empregado incorpore-se efetivamente à empresa, de forma a sociabilizá-la. Deste processo, existe a possibilidade de compatibilizar a reorganização produtiva, o avanço dos processos de terceirização e a nova tecnologia aliada com as novas formas de gerenciamento, sem que com isso se tenha necessariamente o desemprego e a desvalorização do homem. Exercendo o Estado a sua função reguladora, dinamizando-se o direito do trabalho segundo essas novas premissas, tornando-se possível alcançar  resultados excelentes de humanização da empresa e do espaço externo em que a empresa está localizada.

Na verdade, tudo isso poderá significar o rompimento evolutivo do direito do trabalho, que não deverá mais estar a serviço do empregado. Deverá sim objetivar o meio ambiente do trabalho em busca da socialização da empresa e da sua contribuição no meio social (contribuição externa), caracterizando-se assim a chamada desconcentração do poder, que deixa a forma concentrada na figura do Estado, passando a localizar-se em outras esferas do social.

Referências bibliográficas:

 01)NETO, Pedro Vidal. A Terceirização Perante o Direito do Trabalho. In: MALLET, Estevão e ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim ( coord.). Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr. 1996, p. 91.

02)MELHADO, Reginaldo. Poder e Sujeição. São Paulo: Ltr. 2003, p. 144-45.

03)OLIVEIRA, Lourival José de. Direito do Trabalho: organizações de trabalhadores e modernização. Curitiba: Juruá, 2003, p.169-70.

04)CONCEIÇÃO, Maria de Conceição. A terceirização e o direito no Brasil. Capturado no endereço http://www.foconet.com.br

05) MORAIS FILHO, Evaristo de. A função social da empresa. In: MALLET, Estevão e ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim. Direito do Trabalho. São Paulo: Ltr. 1996, 141.

06)Segurança nas plataformas da Petrobrás é questionada. http://www.gustavorcs.hpg.ig.com.br/materias.htm. Capturada em data de 29.10.03.

07)PRUNES, José Luiz Ferreira. Trabalho Terceirizado e Composição Industrial. 2ª ed. Curitiba: Juruá, 2002.

 

 

 

 


 

 

NOTAS:

[1] NETO, Pedro Vidal. A Terceirização Perante o Direito do Trabalho. In: MALLET, Estevão e ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim (coord.). Direito e Processo do Trabalho. São Paulo: LTr, 1996, p. 91.

[2] O relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) sobre o afundamento da plataforma P-36 pede que o Ministério Público analise a tragédia, ocorrida em março, como ''crime culposo'' (não intencional). Onze petroleiros morreram. A CPI pede a responsabilização criminal dos diretores da Petrobrás que contrataram e acompanharam a construção da P-36 - o que inclui a gestão anterior e a atual de Philippe Reichstul.

A CPI concluiu também que a terceirização da mão-de-obra na Petrobrás foi um dos itens que pesaram para o acidente da P-36. O relatório será encaminhado ao Ministério Público e ao Tribunal de Contas da União, além da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Marinha, Polícia Federal e à própria Petrobrás.

[3] Petrobras assinará convênio para reduzir trabalho terceirizado.O secretário de Energia, Indústria Naval e Petróleo, Wagner Victer, anunciou na sexta-feira que o presidente da Petrobrás, Henri Phillippe Reichstul, assina na quarta, às 18 horas, com o presidente da Confederação Nacional de Trabalhadores em Transportes Aquaviários, Severino Almeida, protocolo de intenções para reduzir o número de trabalhadores terceirizados em plataformas e navios petroleiros. O objetivo é também de melhorar e aumentar a quantidade de acordos coletivos de trabalho para o setor. A decisão foi tomada durante o encontro Offshore Taks Force Group, promovido no Rio de Janeiro pela ITF (Federação Internacional de Trabalhadores em Transportes Aquaviários).

Reunindo duas dezenas de representantes sindicais dos mais de 300 mil trabalhadores marítimos e petroleiros que atuam em embarcações de apoio (offshore) e nas plataformas de prospecção e exploração petrolífera em todo o mundo, o encontro representou avanço nas relações de trabalho deste segmento da indústria de petróleo em águas profundas, que detém as mais altas taxas de crescimento do setor.

"Aproveitamos o evento para estabelecer nossos alvos, apontar as empresas que trazem mais problemas aos trabalhadores em todo o mundo, aquelas que insistem em manter comportamentos condenáveis em suas relações com os trabalhadores", anunciou o representante dos países da América Latina no Comitê, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviários e Aéreos, na Pesca e nos Portos, Severino Almeida. www.lneves.com.br/terceiri.html. Capturado em 29.10.03.

[4] MELHADO, Reginaldo. Poder e Sujeição. São Paulo:LTr. 2003, p. 144 e 145

[5] OLIVEIRA, Lourival José. Direito do Trabalho: organizações de trabalhadores e modernização. Curitiba: Juruá. 2003, p. 169 e 170.

[6] Trata-se da instituição do chamado condomínio industrial. No setor automobilístico, vale citar o exemplo da fábrica de caminhões da Volkswagem, em Resende/RJ, onde  as antigas fornecedoras de peças tornaram-se as verdadeiras montadoras, todas irmanadas pela responsabilidade solidária da produção.

A organização da produção em Resende já foi planejada desde o início de funcionamento da fábrica para que a própria operação de montagem das peças no veículo fosse realizada por empresas terceiras na linha de produção "supervisionada" pela Volkswagen. Não há ali nenhum trabalhador direto da própria VW nessa tarefa produtiva de montar os componentes dos veículos.

[7] Lei 7.102/83 e 6.019/74, respectivamente.

[8] CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – LEGALIDADE. Salvo os caos de trabalho temporário e de serviços de vigilância, previstos nas Leis ns. 6.019, de 3.01.74 e 7.102, de 10.06.83, é ilegal a contratação de trabalhadores por empresas interpostas, formando-se o vínculo empregatício diretamente com o tomador de serviços.

[9] Maria da Consolação Vegi da Conceição explica em seu artigo “A terceirização e o direito no Brasil”: “ Por sua vez, a fábrica de caminhões da Volkswagen e Resende, fundada em 1996, vem sendo considerada por muitos como a fábrica do futuro. Lá, a Volkswagen estabeleceu parceria com dez empresas fornecedoras de componentes. Estes fornecedores, além de responsáveis pelo suprimento de componentes ( módulos ), são também encarregados pela montagem dos módulos do veículo, logística e abastecimento. A Volkswagen cabe a função  de projetar o veículo, supervisão da produção ( o que inclui o controle de qualidade ) e a venda final do produto. A organização da produção  em Resende já foi planejada desde o início de funcionamento da fábrica para que a própria operação de montagem das peças no veículo fosse realizada por empresas terceiras na linha de produção “supervisionada”pela Volkswagen. Não há ali nenhum  trabalhador direto das própria VW nessa tarefa produtiva demonstrar os componentes dos veículos.”Capturado em data de 20.10.03. Endereço eletrônico: http://www.foconet.com.br

[10] OLIVEIRA, Lourival José de. Direito do Trabalho: organizações de trabalhadores e modernização. Curitiba: Juruá, 2003, p.218-219.

[11] MORAIS FILHO, Evaristo de Morais. A função social da empresa. In: MALLET, Estevão e ROBORTELLA, Luiz Carlos Amorim. Direito e Processo do Trabalho. São Paulo: LTr. 1996, p. 141.

 

 


 

* Lourival José de Oliveira: professor do Curso de Graduação em Direito da Universidade Estadual de Londrina; Professor do Curso de Mestrado em Direito Negocial da Universidade Estadual de Londrina; Professor do Curso de Direito da Unimar (disciplina Tópicos Avançados).

Ref.:  mfat@sercomtel.com.br

 


 

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