Derecho y Cambio Social

 
 

 

A PRESENÇA DOS EUA NO MUNDO. HEGEMONIA OU IMPERIALISMO?

Renato Ribeiro Velloso (*)


 

                        Nos dias de hoje, parece impossível ao ser humano viver sem se questionar, em algum momento, sobre a presença dos EUA no mundo, hegemonia ou imperialismo? Para encontrarmos alguma pista a tal questão, vamos primeiramente conhecer o significado destas palavras e sua prática desde o mundo antigo.

                        A palavra hegemonia deriva do grego hegemonikós, é entendida como preponderância, supremacia, superioridade de um povo sobre outros povos; já o imperialismo, tem sua origem no latim imperium (domínio), é tido, em matéria política, como a tendência expansionista de um Estado no sentido de alargar o seu domínio ou poder, sob o ponto de vista administrativo, político, ou mesmo econômico, a outros Estados ou a outros povos.

                        Entre os séculos VII e VI a.C., a Grécia viveu período de grande desenvolvimento. Assimilando elementos de outras culturas, adaptando-os e aprimorando-os, os gregos construíram uma civilização admirável, sem paralelo na cultura ocidental, e esse processo propiciou o renascimento econômico, artístico e cultural do mundo, consolidando a hegemonia grega sobre os outros povos.

                        Em meados do século IV a.C., Alexandre Magno assumiu o trono da Macedônia e iniciou uma série de conquistas que vieram a constituir um vasto império que incluía a Grécia, o Egito, a Pérsia e parte do território hoje ocupado pela Índia. O domínio durou por muito tempo, mesmo após a morte de Alexandre, e só encontrou seu fim com o desenvolvimento do poderio de Roma, que conquistou a Grécia no século I a.C. Todo o curso da história judaica e palestinense foram dominados pelo poder imperial da Roma que por muitos anos tornou-se um dos impérios mais conhecidos da história.

                        No sentido econômico, hodiernamente revela-se a mesma tendência expansionista dos antigos impérios, na política hegemônica dos Estados Unidos, ou seja, o acumulo de domínio sobre o capital, terras, passando a ter poder decisivo nas questões de produção ou de consumo, onde governarão todas as operações referentes à certa soma de mercadorias, no intuito de auferir maiores lucros e poder.

                        A necessidade seria uma fase de evolução do capitalismo caracterizada pela criação de monopólios internacionais que partilhariam a sua influência, soberania, aliança entre o capital financeiro e o capital industrial, e a exportação de capital predominante sobre a exportação de mercadorias.

                        Os Estados Unidos possui o supremo poder, ou o chamado poder soberano “imporium merum” que é tido como o poderio absoluto do soberano sobre os seus súditos, com direitos discricionários dos mesmos.

                        “As idéias de classe dominante são, em todas as épocas, as idéias dominantes, ou seja, a classe que é o poder material dominante da sociedade é, ao mesmo tempo, o seu poder espiritual dominante”[i], um exemplo atual desta situação, é a invasão dos Estados Unidos ao Iraque, onde para se afirmar, os americanos não se furtaram em utilizar de todos os meios possíveis, não hesitando nem mesmo em usar a força, para acabar como o “demônio” (Saddam Hussein), e dominar a terra e os bens nela encontrados (usinas petrolíferas).

                        Em 1823, o documento aprovado pelo Congresso americano, proposto em mensagem pelo Presidente James Monroe, conhecido como Doutrina Monroe, tinha como princípios:

  1. o continente americano não pode ser objeto de recolonização;
  2. é inadmissível a intervenção de qualquer país europeu nos negócios internos ou externos de países americanos, e, finalmente;
  3. os Estados Unidos, em troca, se absterão de intervir nos negócios pertinentes aos países europeus.

sendo no seu tempo uma oposição ao colonialismo mais reacionário europeu, através dela os Estados Unidos afirmaram-se como defensores dos países da América Latina, e, a partir daí, a doutrina serviu de fundamento às mais variadas ingerências e intervenções americanas.

                        Em 1929 os Estados Unidos já demonstrava que seria uma potência, hegemonico-imperialista. Folgadamente o mais rico país do mundo, produzia dois quintos de todos os bens industriais. A crise que eclodiu na Bolsa de Valores de Nova Iorque, que afetou profundamente todos os grandes países do mundo, fez com que o desemprego norte americano que estava numa faixa de dois milhões em 1929, subir para mais de doze milhões em 1932, e não caiu abaixo dos sete milhões senão em 1940.

                        Nesse período, os grandes países industriais, em vez de empreenderem ação comum contra perigos comuns, tentaram isolar-se uns dos outros. Enquanto por outro lado os Estados Unidos, procurou reanimar a sua economia, ao mesmo tempo em que elevava as suas tarifas, não perdendo seu poder perante os outros países.

                        O modelo desenvolvido por Hitler, fez da Alemanha, uma nação que fora o berço original da liberdade, para alguns, e por outro lado estava consolidando sua posse da Europa; o que começava como uma guerra européia e mediterrânea, e que acabou se convertendo verdadeiramente numa guerra mundial. Onde após anos de violência, os Estados Unidos, se reafirmaram como a maior das potências industriais, mobilizando rapidamente seus imensos recursos, se sagrando os grandes vencedores.

                        Após a guerra passou a ser ponto pacifico no ocidente a responsabilidade dos governos em assegurar empregos para todos, controlar a inflação, reconstruir seus países, e manter sadia a economia da nação, de modo geral.

                        Nos países devastados pela guerra, os Estados Unidos com hegemonia, e com o fito de fortalecer o mundo não comunista, puseram em execução planos de reconstrução, para os países amigos destruídos, como o Plano Marshall, e cuidaram também de propiciar serviços sociais numa escala jamais tentada antes, e lançaram pesados impostos sobre grandes rendas e propriedades herdadas.

                        O ocidente atravessou uma profunda revolução econômica e social; essa mudança em grande escala enriqueceu enormemente o lado ocidental, especialmente os Estados Unidos, que firmava cada vez mais seu poder hegemônico perante a União Européia e Japão, e, o seu imperialismo em relação aos países em desenvolvimento e subdesenvolvidos. O capitalismo significa costumeiramente a posse e o controle dos meios de produção por indivíduos privados americanos, cabendo ao governo dos demais estados, fazer pouco mais que manter a lei e a ordem.

                        O livro “Imperialismo, estádios supremo do capitalismo”[ii], de Lênin, é fundamental para compreender a história contemporânea, ele descreve o imperialismo como “a época do capital financeiro e dos monopólios”[iii], resumidos em “cinco caracteres fundamentais:

  1. concentração da produção e do capital atingindo um grau de desenvolvimento tão elevado que origina os monopólios cujo papel é decisivo na vida econômica;
  2. fusão do capital bancário e do capital industrial, e criação, com base nesse ‘capital financeiro’, de uma oligarquia financeira;
  3. diferentemente da exportação de mercadorias, a exportação de capitais, assume uma importância muito particular;
  4. formação de uniões internacionais monopolistas de capitalistas que partilham o mundo entre si;
  5. termo da partilha territorial do globo entre as maiores potências capitalistas.”[iv]

                        Com a globalização o imperialismo, se fez composto por potencias como os Estados Unidos, União Européia e Japão, e por organizações dependentes dessas potências, sobretudo dos EUA, assim, “pressionam outros países a adoptarem valores e práticas norte americanas em temas tais como direitos humanos e democracia; impedir que outros países adquiram capacidades militares que possam inferir na superioridade militar norte americana; fazer que a legislação norte americana seja aplicada em outras sociedades; qualificar outros países em função da adesão aos padrões norte americanos em matéria de direitos humanos, drogas, terrorismo, proliferação nuclear e de mísseis e, agora, liberdade religiosa; aplicar sanções contra os países que não se adaptam aos padrões norte americanos nessas matérias; promover os interesses empresariais norte americanos com os slogans do comércio livre e de mercados abertos, e modelar as políticas do FMI e BM para servir a esses mesmos interesses (...) forçar outros países a adoptar políticas sociais e economicas que beneficiem aos interesses econômicos norte americanos; promover a venda de armas norte americanas e impedir que outros países façam o mesmo (...) classificar certos países como ‘Estados pátrias’ ou delinqüentes e excluí-los das instituições globais porque se recusam a prostar-se diante dos desejos norte americanos”[v].

                        Os EUA é um país largamente hegemônico, o que é grande verdade é que as grandes potências “são aliadas e também competem”[vi], fazendo com que alguns fatores fazem destes um imperialismo global; tendo interesses comuns, como o mercado mundial, e o poder sobre os países em desenvolvimento. A onipotência dos Estados Unidos, pode se entender da seguinte forma, existente por si próprio e a si próprio suficiente, se tornando superior a todas as regras morais, se tornando um organismo amoral e depredatório, empenhado em sobrepor-se aos outros estados por meio da força. Não tendo, para reger-se, senão sua vontade e soberania.

                        Com essa visão sobre a presença americana no mundo, podemos afirmar que uma oposição a esta política, implica na desordem, quebra de sistema, destronamento da ordem estabelecida, ou seja, o rompimento com a ordem mundial e as suas instituições de poder.

                        “O valor duma coisa consiste muitas vezes não no que se ganhou ao adquiri-la, mas sim no que se faz para obtê-la..."[vii], quando olhamos a história da civilização e fazemos um paralelo com a história norte-americana, notamos que quase todos os países imperialistas, começam sua caminhada de forma parecida, ou seja, num primeiro momento são hegemônicos, após um determinado momento de preparação, esperam o momento certo para intervir e impor sua superioridade sobre os outros povos, quando essa superioridade é confirmada, vem à necessidade de ser fortes, acumulando elementos como poder político, econômico e militar, assim alargam seus domínios, intervindo na vida política e econômica de diversos países.

                        Esse é o instinto do imperialismo dos EUA, que sempre se colocou como um país que nasceu de forma privilegiada, onde sua atuação no mundo se deve ao poder conquistado após o final da 2ª Guerra e que aumentou com a globalização. A presença imperialista dos EUA consiste no jogo incessante de criar, desenvolver, frear ou deslocar relações de domínio, onde toda luta trava-se pela conquista de novos espaços.

 


 

NOTAS:

[i] A ideologia alemã, Marx e Engels, OE, edições Avante p.38.

[ii] Obra escrita por Lênin em Zurich durante a Primavera de 1916.

[iii] “Imperialismo, estádio supremo do capitalismo” cap.9.

[iv] “Imperialismo, estádio supremo do capitalismo” cap.9.

[v] Samuel P.Huntington, citado por Atílio A.Boron, “império e imperialismo”, p.84/5.

[vi] James Petras. “O imperialismo do EUA hoje”.

[vii] Friedrich Nietzsche. “O crepúsculo dos ídolos”, p.89.

 

 


(*) Pós-graduado em Direito Penal Econômico Internacional, pelo Instituto de Direito Penal Econômico e Europeu da Universidade de Coimbra, Portugal, e cursando MBA em Economia e Direito do Sistema Internacional, pela Universidade de São Paulo – USP.

E-mail: renatov@ajato.com.br

 


 

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