Derecho & Cambio Social

 
 

 

EVOLUÇÃO DO FEDERALISMO BRASILEIRO EM FACE DO
FEDERALISMO NORTE AMERICANO

Adriano Fernandes Ferreira (*)

 


   

Introdução

Antes de abordamos o tema nos dias atuais, cabe-nos fazer um apanhado histórico do federalismo. Pesquisaremos o assunto junto a Nação norte americana, estabelecendo uma relação de como foi e como está sendo o federalismo naquele País agora.

Após, estabelecermos esta diferença caminharemos delimitando o tema, conceituando e diferenciando federalismo de confederação e ambos de soberania, esta interna e externa.

Será dedicado trechos para explicitar e definir as características peculiares do federalismo e se se trata de um sistema, regime, ou forma Estado?

Depois de trilhar as diferenças, realizaremos a analise ao tema que propomos a estudar, ou seja, o federalismo brasileiro. Fazendo um estudo da sua origem no Brasil, caminhando pela evolução no século XX, até a Constituição de 1988, que dignifica o nosso trabalho, explorando as competências delegada a cada membro do ente federativo.

Para delimitar o tema, seguiremos os passos do conspícuo parlamentar e professor MICHEL TEMER que faz uma distinção relevante para o trabalho.

Para concluir a importância sobre o tema federalismo, faremos uma comparação do brasileiro com o norte americano. E, ainda, qual a resposta para o nosso federalismo, se está como idealizado pelos parlamentares de 1891ou se houve distorção no decorrer do tempo.

Conceito

Para iniciarmos o trabalho proposto é de suma importância fazermos a distinção entre confederação e federalismo, pois trata-se de institutos com características peculiares, mas próximas entre si, v.g., a primeira é matéria de direito público internacional, enquanto que a segunda de direito público interno, entre outras diferenças que serão definidas no decorrer do trabalho.

Confederação é um vocábulo derivado do latim confoederatio, de confoederare, que indica pacto, união, convenção.[1] É matéria que tem estudo no direito internacional público, que é definida como agrupamento de Estados, que se dá por um tratado ou convenção, os quais se unem, mas não limitam sua soberania e nem a sua personalidade jurídica.

Um dos Estados membros, normalmente, passa a ser a sede ou capital da confederação. Os Estados-membros, como já foi dito, não perdem a sua soberania, portanto, necessário se faz que cada decisão tomada pela confederação seja ratificada pelos Estados integrantes do acordo. [2]

A qualquer momento o Estado-membro pode se desligar, ou seja, rescindir o pacto e deliberar sem consentimento dos demais Estados, exemplo de confederação podemos citar: os Estados Unidos da América de 1781 a 1787, e a Germânia de 1815.

Ao contrário da confederação o federalismo e matéria de direito público interno, ou da teoria geral do Estado como prefere alguns autores. Divergência doutrinária, também, se dá quanto a ordem constitucional, para uns é formas de Estado, para outros formas de governo, e para uma minoria regimes de governo. Portanto, concluir sobre esta ordem seria se filiar a uma corrente doutrinária negando as outras, cabe a cada interessado pautar pelo censo do razoável e admitir a sua filosofia em função das matérias propostas por cada corrente. Para nos federalismo é forma de Estado, pois se trata da condição do Estado com as suas ramificações. 

Para conceituar federalismo, de igual forma, podemos nos pautar no discenso e afirmar que é contraditório, mas simplificando o conflito é o “sistema político que consiste na união de Estados numa Federação, mediante agregação ou desagregação”, ou ainda, “organização política em que há associação de vários Estados, que abandonam certos atributos da soberania em prol do Estado Federal”.[3]

A forma de governo pode ser monárquica ou republicana, a forma de Estado, porém, se classifica em federativa ou unitária. O Estado ao optar por uma forma terá plena liberdade para elaborar sua Constituição, suas leis, decidir qual a forma de governo e regime a ser adotado. Para BELFORT MATTOS, é o poder de deliberar “os destinos da Comunidade”[4], é a soberania interna.

As relações jurídicas que um Estado tem com respeito a outro define-se de soberania internacional ou independência. Esta que o Estado pode delegar e unificar, quando se trata de federalismo e confederação, pois pode-lhes limitá-la, dividí-la ou atribuí-la, fazendo pactos ou fusão com outras Nações. Bem coloca o constitucionalista FERREIRA FILHO, que:

“Costuma-se opor, na teoria do Estado, soberania a autonomia. Nessa contraposição, entende-se que soberania é o caráter supremo de um poder: supremo, nisto que esse poder não admite qualquer outro, nem acima, nem em concorrência com ele. Já autonomia é o poder de auto-determinação, exercitável de modo independente, mas dentro de limites traçados por lei estatal superior.” [5]

Federalismo nos Estados Unidos da América

A federação americana derivou da independência das 13 ex-colônias inglesas que se fundiram dando origem aos Estados Unidos da América. Com a fusão formularam a Constituição Federal, impondo a superioridade da União, em face da Constituição dos Estados.

Para ocorrer a unificação cada Estado-membro abriu mão de uma parcela de seu poder repassando para a União. Assim, a União detinha uma esfera de poder e representava a coletividade dos Estados federados, o sistema de governo adotado foi o representativo republicano, o bicameralismo, estabelecia a supremacia da Constituição Federal, a separação de poderes, talvez, o mais importante, prescrevia sobre a Declaração de Direitos (Bill of Rights). Cabendo a Corte Suprema a interpretação da competência do poder federal.

Com a abolição da escravatura pelo Presidente Abraão Lincoln, no decorrer da guerra da secessão, marca este ponto na história, pois o poder Executivo se exalta, isto é, decidindo questão que não está na esfera de sua competência. Superada a guerra a Corte Suprema, após uma evolução lenta, limita a competência da União para que esta não adentre na competência dos Estados-membros.

Hodiernamente, a realidade da federação americana e bem diferente daquela idealizada por seus criadores na primeira reunião da Filadélfia. E, novas prerrogativas foram incumbidas ao Estado Federal  evoluindo na forma de Estado que passa a ser chamada de “federalismo moderno”, modificando suas características ora daquela idealizada. Na qual incumbia ao Estado resolver os problemas da vida social que é função delegada ao governo federal; e os Estados federados são soberanos nas suas esferas de diligências.

O federalismo dualista foi aos poucos sendo conquistado pelo federalismo cooperativista, no qual o poder se concentra no governo federal, que se funda em uma interação federal-estadual para a solução de objetivos comuns, tais como: problemas sócio-econômico e resolução das necessidades públicas.

No federalismo cooperativo os Estados são células administrativas que complementam a política federal. Tendo como enfoque a política descentralizada. Com essa nova estruturação fica evidente que se ampliou os poderes da federação, por sua vez limitando os poderes dos Estados-membros.

Sobre a divisão de poderes é de suma importância salientar a colocação do ilustre JORGE MIRANDA, que assim assevera:

“As indagações sobre as peças fundamentais da organização democrática do Estado, através das quais seja permitida a prossecução de interesses próprios das populações respectivas, conduzem a princípios de descentralização administrativa, através da qual serão definidas as atribuições e organização dos entes locais, a competência de seus órgãos, a autonomia financeira, para a justa repartição dos recursos públicos no Estado. Mesmo as novas tentativas de institucionalização de formas de Estado, com o Estado autonômico ou o Estado regional discutem temas relevantes do Estado Federal, com a participação no exercício do poder legislativo e a repartição de competências, que consagrem a ‘repartição vertical’ e a ‘repartição horizontal’ na definição das três espécies de competências regionais: 1) competência exclusiva; 2) competência complementar; 3) competência integrativa.” [6]

Conclui-se que os Estados federados são independentes constitucionalmente, mas não define claramente acerca da responsabilidade entre o governo federal e os Estados-membros, delegando poderes à Nação e outras aos Estados, obscurecendo por completo qual responsabilidade é incumbida a um e ao outro.

O Executivo, sistema presidencialista, é representado pelo Presidente da República. O Legislativo é composto por duas Câmaras, ou seja, o sistema é bicameral, no qual o Senado é composto por dois senadores que representam os seus respectivos Estados  perante a Federação. E a Câmara dos Deputados é composta pelos Deputados Federais que representam seus Distritos, que é previamente delimitado pelo Poder Legislativo local.

A competência que diz respeito a União vem expressa na Constituição Federal, que ainda, determina que a ela incumbe garantir a forma republicana de Governo; garantir que o Poder Legislativo seja efetivado conforme determinações legais, ou seja, que a representação popular na Câmara seja respeitada e a representatividade dos Estados federados perante a União se concretize com a participação  dos Senadores; e, de garantir que não ocorra a invasão de um Estado-membro pelo outro.

Ainda, em se tratando de competência dos Estados e da União existe competência exclusiva, v.g., defesa nacional, regulamentação de comércio entre Estados, defesa dos direitos constitucionais e política internacional, atribuída a União, competência concorrente imputadas à ambas, mas é de salientar que aos Estados federados e defeso certas funções, v.g., negociar Tratados, Alianças, ou tributar importações ou exportações.

Portanto, é de concluir que no federalismo americano a autonomia política dos Estados federados é de igual intensidade com uma repartição constitucional de competência política, administrativa, legislativa, de modo a possibilitar-lhes capacidade de organização, administração e legislação própria, não sujeitas à autoridade de outra pessoa política, mas apenas da própria constituição.

A evolução do federalismo brasileiro

O Federalismo brasileiro nasceu às avessas[7] dos Estados Unidos da América, enquanto eles fundiram as treze ex-colônias se integrando; nós ramificamos, ou seja, de uma ordem centralizada (Estado Unitário) no Império para uma ordem de federação de repartição de poderes e competências. A República Federativa foi instaurada, provisoriamente, no Brasil pelo Decreto nº. 1, de 15 de novembro de 1889 [8], baseada nas reivindicações do Manifesto Republicano de 1870, derrogando, assim, a monarquia de D. Pedro II, pondo fim ao período imperial no território brasileiro.

Em 24 de fevereiro de 1891 foi promulgada a primeira Constituição dos Estados Unidos do Brasil, que ao institucionalizar a Federação seguiu o modelo do federalismo dualista. A constituição, ainda, estabeleceu que o Brasil se compunha de vinte Estados-membros derivado das províncias e o Rio de Janeiro, a primeira Capital da República, como Distrito Federal.

Na primeira Constituição Federal, na visão de PINTO FERREIRA, se caracteriza por preterir uns Estados aos outros,  que assim assevera:

“Estabeleceu um regime de competências divididas entre a União e os Estados-membros. Estabeleceu também um sistema de divisão de rendas. Aos Estados-membros se reservaram inúmeros poderes e mesmo houve um certo exagero do estadualismo, porque no fundo a política brasileira de então foi a política dominante nos grandes Estados da Federação brasileira, especialmente São Paulo e Minas Gerais, os dois Estados mais fortes da Federação.” [9]

Na Primeira República, não houve uma congregação do direito brasileiro. O ponto relevante, talvez, seja, a edição do Código Civil datado de 1916, instituindo assim para todo o território um direito substantivo único, pois o direito processual cada qual possuía o seu. O governo federal, indiretamente, é quem controlava os Estados-membros restringindo, de certa forma, a sua autonomia.

No período de 1937 a 1945, o Presidente da República Getúlio Vargas, com comandos positivos e inobservando a Constituição Federal, praticamente, suprime o federalismo, havendo um centralismo exacerbado nas mãos do ditador. Com o Decreto-lei nº 1.202/39 prescrevia que os governadores dos Estados eram interventores da União.

Como na história uma fase é antagônica a outra, no Brasil de 1946 com a promulgação da Constituição, tida como social-democrática, o País vive momentos de glória, o êxtase da democracia reina entre a população. É previsto constitucionalmente, entre outros, os direitos e garantias individuais, a interferência econômica mínima da União nos Estados, ainda, restabeleceu a autonomia dos municípios e a participação dos trabalhadores nos lucros das empresas.

JANICE HELENA FERRERI em analise a técnica da constituição de 1946, afirma que:

“ A técnica constitucional brasileira adotada em 1946 foi inspirada na Constituição da Filadélfia  e na Constituição de Weimar, posto que discriminou as competências da União, deixando aos Estados-membros os chamados ‘poderes reservados’.” [10]

No período da redemocratização, os Estados-membros passaram a ser, de certa forma, autônomos legislativa e politicamente, o mesmo se aplicando aos municípios, o que não detinham era autonomia financeira.  Consagrou-se nesta época a harmonia entre os três poderes, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário.

Ocorreram quatro eleições para Presidente da República, nesses 18 anos, além, de inúmeras seleções para as casas legislativas federais, estaduais e municipais, os cidadãos exerceram alguns dos direitos garantidos constitucionalmente, inerentes a cidadania, que pelo sufrágio escolheram os seus representantes.

Mais um retrocesso aconteceu com a frente político-militar, que em 9 de abril de 1964, com a publicação do Ato Institucional fez drásticas modificações na Constituição. O principal impacto para o federalismo foi a União sugar a autonomia dos Estados federados, se beneficiando com a centralização do poder político na pessoa do Presidente da República.

Em se tratando de cooperação e ajuda da União aos Estados-membros só ocorreria em extrema urgência e de relevante penúria.[11]

Os Atos Institucionais subsequentes filtraram a autonomia do Poder Legislativo promulgando uma nova Constituição em 1969, na qual estabeleceu uma maior amplitude de competências e atribuições legislativas a União. Também, incumbiram ao Supremo Tribunal Federal a competência para solucionar litígios entre os Estados federados e a União.

Para o nobre parlamentar e constitucionalista MICHEL TEMER, que assim expõe:

“Essa Constituição, portanto, concentrou poderes na União e, nesta, na figura do chefe do Executivo. Por isso, não há como negar a evidência: a Federação norte-americana foi a inspiradora dos federalistas brasileiros. mas o Brasil muito se afastou, depois, daquela fonte iluminadora.”[12]

Portanto, nesse período militar o federalismo era formalmente aplicado, ou seja, não passava de uma mascara, pois o poder político-econômico  quem o detinha era o governo federal. Para FERREIRA FILHO, nessa década, surgiu um moderno tipo de federalismo, o federalismo integrativo.[13]

O militarismo vedou qualquer forma de crescimento do federalismo, ao contrário, podou o seu desenvolvimento, restringindo os federados de caminharem sozinhos. Superada esta fase de quase escuridão o federalismo trilha por uma fase neutra, que se intercala entre o período militar  e a Constituição de 1988.

O que ocorreu no Brasil é que o federalismo marchando, paulatinamente, estruturou e se reergueu. Afirmado nos princípios e nas idéias primordiais da convenção da Filadélfia, se adaptou  aos movimentos que deram origem ao novo Estado, organizados em Estados federados, preparando-se para a nova fase democrática brasileira.

Baseada em idéias e argumentos fortes, particulares da necessidade do povo brasileiro, com a participação popular (representados por seus Deputados Federais e os Senadores da República representando os seus respectivos Estados federados) fizeram a reforma de 1988. 

Em 5 de outubro de 1988, é promulgada a Constituição Cidadã, assim declarada pelo imortal Presidente do Congresso Nacional, o Deputado Ulisses Guimarães. A Carta Magna não cansa de afirmar que o os Estados-membros é indissolúvel, portando, federados e, ainda, acresceram o municipalismo, estabelecendo a descentralização de competências. A Constituição brasileira difere das outras pátrias e apátrias, pois evidência três ordens, senão vejamos: - ordem total, a União; - ordens regionais, os Estados; - e as ordens locais, os municípios. Implantando um federalismo real e efetivo no Brasil.

O federalismo implantado com a Constituição Federal de 1988 visa a disseminar competências e poderes aos entes políticos: União, Estados federados, Municípios, Distrito Federal. Todos dotados de autonomia política, administrativa e tributária. A partir de outubro de 1988 o Município adquiriu a qualidade de ente federativo, o que não ocorria antes. E, também, a nova Carta Magna estabeleceu áreas de atuação conjunta de todos os entes federativos, especialmente, em matérias de relevante interesse social.

As competências podem ser classificadas por diversas formas, a mais usual é com relação ao ente político, quanto ao que devem fazer ou não fazer conforme determina a Constituição. Senão vejamos como é a distribuição da competência para as pessoas jurídicas de direito público interno:

União

competências exclusivas - art. 21;

competências privativas - art. 22, parágrafo único;

competências legislativas - art. 22;

competências administrativas - art. 21;

competências tributárias - residual

Estados-membros

competências exclusivas - art. 25, §§ 2º e 3º;

competências legislativas – residual;

competências administrativas – residual;

competências tributárias - art. 155.

Municípios

competências legislativas - art. 30, I e II;

competências administrativas - art. 30, III, IV, V, VII, VIII;

competências tributárias - art. 156.

Área de atuação comum aos entes federativos:

competências concorrentes/legislativas - art. 24;

competências comuns/materiais - art. 23;

Competências tributárias comuns - os fundos e quotas de participação em tributos e o art. 145 da Constituição Federal  de 1988.

Em uma visão intrínseca da Constituição, explicitará alguns elementos, que em se tratando de Federação governa os caminhos do legislador e interpretadores jurídicos, fazendo alusão aos princípios norteadores do federalismo, adaptando o sistema ao adotado na Carta Magna brasileira, que ESTHER BUENO SOARES, alude os ensinamentos do catedrático MICHEL TEMER, que ao nosso ver é o de maior confiança, o que não significa dizer que seja o melhor, mas o mais atual com o pensamento moderno, incrementado por situações fáticas que foram absorvidas nas reformas constitucionais, pois o conceito de federalismo sofreu e vem sofrendo mutações. Que são os seguintes:

Existência de uma Constituição rígida

Para CRETELA JÚNIOR  nenhuma norma jurídica é imutável, perene, portanto, a rigidez constitucional diz respeito ao seu grau de imutabilidade. Senão vejamos:

“Constituição rígida é aquela que não pode ser alterada a não ser mediante processos diferentes dos processos válidos para a elaboração das leis ordinárias, ou seja, a que é dotada de certo grau de imutabilidade, em razão de procedimento especial, que deve ser rigidamente observado para sua modificação.” [14]

A Constituição traz em seu bojo todas as competências da União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. Observados os limites de cada ente para que não ocorra atos que violem a esfera de competência, com isso não sendo inconstitucionais.

O Estado ter seu próprio território

Assim, definiu HANS KELSEN que o território é a base física, o âmbito geográfico da nação, onde ocorre a validade da ordem jurídica.

“O território do Estado é um espaço rigorosamente delimitado. Não é um pedaço, exatamente limitado, da superfície do globo, mas um pedaço tridimensional ao qual pertencem o subsolo, por baixo, e o espaço aéreo por cima da região compreendida dentro das chamadas fronteiras do Estado.” [15]

Para o professor SAHID MALUF, que analisando o conceito de território de um Estado conclui que é “espaço de validade da ordem jurídica”.[16] E continua explicitando os elementos que o compõe:

“a) o solo contínuo e delimitado, ocupado pela corporação política; b) o solo insular e demais regiões separadas do solo principal; c) os rios, lagos e mares interiores, d) os golfos, baías, portos e ancoradouros; e) as partes que o direito internacional atribui a cada Estado nos rios e lagos divisórios; f) o mar territorial e respectiva plataforma marítima; g) o subsolo; h) o espaço aéreo (supra-solo); i) os navios mercantes em alto mar; j)os navios de guerra onde quer que se encontre; l) os edifícios das embaixadas e legações em países estrangeiros.” [17]

A existência de um povo próprio

Se o Estado possui um território delimitado e demarcado no qual impera as leis decorrentes da vontade de um povo, vale dizer que, os indivíduos que estiverem dentro dos limites territoriais fazem parte daquele Estado e por isso devem obediência as normas instituídas por ele. Portanto, o povo em sentido amplo assemelhasse a população, mas em sentido restrito conceitua Nação.

Os poderes do Estado derivam da sua Constituição

Subentende que no federalismo o Estado-membro extraiu uma parcela de seu poder delegando a União (assim aconteceu no federalismo americano), mas no Brasil como visto, anteriormente, o federalismo partiu de um Estado Unitário, centralizado, para um Estado Federal, descentralizado. Com isso, prudentemente a Constituição traz expressamente as competências inerentes a União, Estados-membros e aos Municípios. (supra citado)

A vontade do povo

O sistema de federalismo adotado no Brasil é o dualista, no qual é composto por duas câmaras. Com o bicameralismo, uma Câmara representa os Estados-membros que é o Senado Federal, previsto no artigo 46 da Constituição Federal, que preceitua:

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário.

§1º. Cada Estado e o Distrito Federal elegerão três Senadores, com mandato de oito anos.

§ 2º. A representação de cada estado e do Distrito Federal será renovada de quatro em quatro anos, alternadamente, por um e dois terços.

§ 3º. Cada Senador será eleito com dois suplentes.

E, a outra Câmara representa o povo, que é a Câmara dos Deputados Federais, previsto no artigo 45 da Constituição Federal, que preceitua:

Art. 45. A Câmara dos Deputados, compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

§ 1º. O número total de Deputados, bem como a representação por estados e pelo Distrito Federal, será estabelecido por lei complementar, proporcionalmente à população, procedendo-se aos ajustes necessários, no ano anterior às eleições, para que nenhuma daquelas unidades da Federação tenha menos que oito ou mais de setenta Deputados.

§ 2º. Cada Território elegerá quatro Deputados.

Portanto, esse sistema defende os direitos decorrentes dos Estados perante a União, representados pelos Senadores da República, e principalmente, do povo que se fará representado por seus Deputados Federais.

A supremacia da Constituição

A doutrina por costume chama a Constituição de leis das leis, o que trocando em miúdos significa dizer que, está explícito na Constituição os mandamentos básicos da ordem social, econômico, política e jurídica de um Estado. A Carta Magna têm supremacia absoluta sobre as normas infra-constitucionais, deve as leis ordinárias limitar a complementá-la nos casos previstos expressamente.

Nos Estados Unidos a Corte americana é a guardiã da Constituição, no Brasil a norma, também, deve seguir o ditado na Constituição e cabe ao Supremo Tribunal Federal zelar pela constitucionalidade das leis. O controle realizado pelo Supremo Tribunal Federal seja processando, seja julgando a inconstitucionalidade ou constitucionalidade das leis ou dos atos normativos praticados pelos entes políticos brasileiros é o chamado controle difuso. Pode, também, o controle ser feito no caso concreto, no qual consiste ao magistrado afastar a norma inconstitucional no caso em julgamento, proferindo a decisão com base em outra norma constitucional.

Capacidade de autoconstituição

Previsto no artigo 25 da Constituição Federal, que preceitua:

Art. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, observados os princípios desta Constituição.

§ 1º. São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam vedadas por esta Constituição.

Em princípio cabe ao legislador estadual legislar sobre matéria permitidas expressamente pela Constituição Federal, ou não proibidas por ela.[18] Não compilando os seus artigos de lei, mas criando novas leis conforme a necessidade de seu Estado, segundo as competências atribuídas a ele.

Conclusão

A federação americana nasceu das treze ex-colônias britânicas que se fundiram dando origem aos Estados Unidos da América. Com a fusão formularam a Constituição Federal, impondo a superioridade da União, em face da Constituição dos Estados. O Federalismo brasileiro nasceu ao contrário daquele, enquanto eles se fundiram, nós dispersamos de uma ordem centralizada (Estado Unitário) no Império para uma ordem de federação de repartição de poderes e competências.

Com a fusão os americanos uniram forças, e força é poder, portanto, uniram-se com intuito de tornar-se uma Nação forte. Já, no caso brasileiro, nos optamos pelo federalismo para não ocorrer uma divisão do território, com isso nos mantendo agrupados em torno de um só governo.

A forma de governo foi mudada, de monárquica para presidencialista e a forma de Estado de Unitária para a Federal.

Em 24 de fevereiro de 1891 foi promulgada a primeira Constituição dos Estados Unidos do Brasil, que ao institucionalizar a Federação seguiu o modelo do federalismo dualista.

O federalismo implantado com a Constituição Federal de 1988 visa a distribuir competências e poderes aos entes políticos: cabe à União (competências privativas - art. 22, parágrafo único; competências legislativas - art. 22; competências administrativas - art. 21; competências tributárias - residual), aos Estados-membros (competências exclusivas - art. 25, §§ 2º e 3º ; competências legislativas – residual; competências administrativas – residual; competências tributárias - art. 155) e, aos Municípios (competências legislativas - art. 30, I e II; competências administrativas - art. 30, III, IV, V, VII, VIII; competências tributárias - art. 156).

Os doutrinadores dizem que a Constituição é a leis das leis, significa dizer que, está implícito na Constituição os mandamentos básicos da ordem social, econômico, política e jurídica de um Estado. Como nos Estados Unidos  a Corte americana é a guardiã da Constituição, no Brasil a norma, também, deve seguir o ditado na Constituição e cabe ao Supremo Tribunal Federal zelar pela constitucionalidade das leis.

O federalismo idealizado pelos constitucionalistas de 1891 se dissipou no tempo e é completamente diferente do federalismo praticado, hodiernamente, no Brasil. Acontece que  a ordem constitucional moderna não condiz com a verdadeira realidade nacional do povo, mas, simplesmente, atende interesses de poucos grupos da elite nacional.

A União e os Estados se vêem desgastados perante o federalismo, pois na pratica o que se vislumbra é a União em desacordo com os Estados-membros e estes com os outros Estados-membros. É lógico que, o federalismo idealizado não era assim pretendido.

Mas, porém, devemos sentar e repensar qual é o rumo que desejamos traçar para com o nosso País. Queremos integrar e somar ou apartarmos e lutarmos cada um por si?

É verdade que a união faz a força.  Por isso, devemos praticar com fervor o descrito na Lei Maior, na Carta Magna, na Constituição Federal, pois nossa norma é perfeita formalmente, o que é utópico é a pratica dessa Lei.

Sem falar em desarmonia, os Estados  federados litigam entre si para obter do governo central “migalhas” que poderiam em comum acordo, sem conflito, resolver. Desta forma pressionando a União a interagir nos problemas estaduais a que ela tanto repulsa resolver. 

A maior esfera de competência fica reservada à União que repassa aos entes federados as de menores importâncias e de menor peso, na matéria tributária o governo federal assegura poder e com isso reserva um respaldo maior para negociar com os Estados. Com a arrecadação dos tributos de forma idêntica a União se nivelaria aos outros entes e dividiria, assim, a fatia de poder que tanto lhe dá autonomia em relação à Estados e Municípios.

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NOTAS:

 

[1] Vocábulo Confederação. In Enciclopédia Saraiva do Direito. nº 17. p.505.

[2] Para MARIA HELENA DINIZ, as decisões são proferidas “ pela assembléia constituída por representantes de cada um deles ou por um dos Estados que a compõe e representa, sendo as decisões tomadas por maioria qualificada e ratificadas pelos Estados confederados”.

[3] DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo : Saraiva, 1998,  p. 531.

[4] MATTOS, José Dalmo Fairbenks Belfort de. Manual de direito internacional público.  São Paulo : Saraiva, 1979, p. 165.

[5] FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional. 23º ed. São Paulo : Saraiva, 1996. p. 41.

[6] Apud,  FERRERI, Janice Helena. A federação. In: Por uma nova federação. Coordenado por Celso Bastos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, pp. 22-3.

[7] Para CELSO BASTOS, que entende porque às avessas: “na experiência norte-americana, tínhamos treze países independentes, que,  através de um acordo, cederam parcela de seu poder ao novo ente que surgiu, resguardando assim muito do que antes era seu. No caso brasileiro, ao invés de diversos Estados, tínhamos um só; o Brasil todo respondia ao domínio do imperador. Depois de proclamada a República e a Federação é que se viu a necessidade de criarem-se os Estados-membros, aos quais delegaram-se algumas competências. Esta talvez seja uma das razões pelas quais o Brasil nunca chegou a ter uma verdadeira federação, onde os Estados alcançam autonomia real. (Curso de direito constitucional. 19ª ed. São Paulo : Saraiva, 1998, p. 155.)

[8] Art. 1º. Fica proclamada provisoriamente e decretada a forma de governo da nação brasileira – a República federativa. 

Art. 2º. as províncias do Brasil, reunidas pelo laço da federação, ficam constituído os Estados Unidos do Brasil.

[9] Curso de direito constitucional. São Paulo : Saraiva, 6ª ed., 1993, p. 270.

[10]  A federação. In: Por uma nova federação.  coordenado por Celso Bastos. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1995, pp. 30-1.

[11] No mesmo sentido, RAUL MACHADO HORTA concorda que “A evolução demonstra que a Federação experimentou um processo de mudanças. A concepção clássica, dualista e centrífuga, acabou sendo substituída pela federação moderna, fundada na cooperação e na intensidade das relações intergovernamentais.” (Tendências do federalismo brasileiro.  In:  RDP 9/7-26, jul-set.)

[12] Elementos de direito constitucional. 13º ed. São Paulo : Malheiros, 1998, p. 73.

[13] FERREIRA FILHO, obra citada. p. 48.

[14] Elementos do direito constitucional.  2ª ed. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1998, p. 19.

[15]  Teoria pura do direito. 4ª. ed. traduzida por João Batista Machado, Armênio Amando, Ed. Coimbra, 1979, p. 388.

[16] Teoria geral do Estado.  21ª ed. São Paulo : Saraiva, 1991, p. 26.

[17] MALUF. Obra citada. Idem.

[18] Para MICHEL TEMER cabe ao legislador estadual conscientizar-se das competências de sua esfera. “Assim, exemplificando, devem prestar obediência ao princípio da fiscalização financeira e orçamentária; ao princípio do processo legislativo. não quer dizer que a forma de fiscalização financeira e orçamentária bem como o processo legislativo sejam transcrição daqueles da União. É preciso que haja no Estado federado um sistema de fiscalização, um sistema de processo legislativo.”(grifo no original) (Obra citada, p. 68).

 


 

(*) Mestrando da Universidade Gama Filho do Rio de Janeiro UGF. Professor da Associação Vilhenense de Educação e Cultura – AVEC – e Advogado em  Vilhena – Rondônia – Brasil.

E-mail: mfat@sercomtel.com.br

 


 

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