Derecho & Cambio Social

 
 

 

AS NOVAS FIGURAS DO DIREITO EMPRESARIAL BRASILEIRO:
EMPRESA E EMPRESÁRIO

Vitor Bizarro Fraga (*)

 


   

1 EMPRESÁRIO

Conforme o art. 966, Código Civil Brasileiro, que assim traz: “Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

Portanto, empresário é aquele que, em nome próprio (assumindo o risco), através do seu estabelecimento empresarial (art. 1142, CC), desenvolve atividade econômica organizada (conjuga os fatores de produção) para fins de produção ou circulação de bens ou serviços.

Este conceito deriva do direito italiano que, em seu diploma legal (no art. 2082, CC Italiano, de 1942), traz assim: “[...] È imprenditore [...] chi esercita profissionalmente uma atività econômica organizzata al fine della produzione o dello scambio di beni o di servizi [...]” [1]

Portanto, o Novo Código Civil disciplina que aquele que exerce atividade empresarial deve ser classificado como empresário individual ou sociedade empresária.

 

1.1 REQUISITOS PARA SER EMPRESÁRIO

1.1.1 CAPACIDADE (ART. 972)

O primeiro requisito é a capacidade. Esta é adquirida quando a pessoa física completa seus 18 anos de idade.

A título de curiosidade, existe uma crítica na doutrina acerca desta capacidade e sobre a emancipação do maior de 16 anos, ou seja, o art. 5º, parágrafo único, V, CC traz assim:

“Art. 5º. A menoridade cessa aos 18 (dezoito) anos completos, quando a pessoa fica habilitada á prática de todos os atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará para os menores, a incapacidade:

V - Pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menos com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria.“

Desta forma, o maior de 16 anos que tiver economia própria poderá se emancipar e se tornar empresário individual.

A doutrina critica esta situação de fato visto que a Lei de Falência diz que só pode ser requerida a falência daquelas pessoas que tem mais de 18 anos.

Além de não ter maioridade penal para responder por eventuais crimes cometidos contra a economia este menor também não estará sujeito aos crimes de falência.

 

Outra situação relacionada á capacidade é a do art. 974. “Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido, continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor da herança.”

Então, exemplificando: o pai era empresário individual e falece. Todos os bens, inclusive aquela firma passam para o filho que tem apenas 4 (quatro) anos de idade.

Diante desta situação, a mãe poderia coordenar a firma em nome do menor?

Antes, no Código Comercial, não poderia. Teria que alienar tudo e o dinheiro deveria ser colocado numa poupança criada em nome do filho.

Hoje, após a entrada em vigor do novo código, a mãe terá que ingressar com ação requerendo a continuidade do negócio em nome do menor.

Será analisado o risco do negócio, ou seja, como se trata de um empresário individual o filho assumirá toda a responsabilidade ilimitadamente pelo negócio.

No caso de a decisão judicial ser favorável o juiz terá que fazer uma cisão (divisão) dos bens. Ou seja, de todos aqueles bens deixados para o menor (filho) será dividido em bens ligados à atividade econômica e bens não ligados á atividade empresarial. É uma forma de proteger o patrimônio da responsabilidade ilimitada.

Sendo assim, o empresário será o filho.

Ainda, aproveitando esta breve abordagem, no caso de o curador, através de sua administração competente, obtiver lucro e, utilizando deste, efetua a compra de um imóvel em nome do menor, este imóvel será parte da parcela que assume o risco visto que, mesmo não tendo relação com a atividade econômica, o acessório acompanhará o principal.

É uma forma indireta de assumir o risco.

1.1.2 NÃO ESTAR IMPEDIDO DE EXERCER A ATIVIDADE ECONÔMICA (ART. 973)

Outro requisito é o interessado em exercer a atividade empresarial não estar impedido por lei de exercê-la, conforme versa o art. 973: “A pessoa legalmente impedida de exercer atividade própria de empresário, se a exercer, responderá pelas obrigações contraídas.”

Outros exemplos são os leiloeiros (Decreto Nº 21,981/32, art. 36), funcionários públicos (Estatuto dos Funcionários Públicos), comandante de embarcação brasileira contratado sob condição de parceria com o armador sobre o lucro proveniente do transporte de carga, salvo havendo convenção em contrário (Código Comercial, art. 524), os militares da ativa (Lei Nº 6.880/80, art. 29), os magistrados (Lei Complementar Nº 35/79 – LOMN, Art. 36, I), os falidos enquanto não reabilitados (Decreto-lei Nº 7.661/45, art 40 e 138), os empresários que desrespeitarem as normas contidas na Lei Orgânica da Seguridade Social (Lei 8.212/91, art. 95, § 2º, d).[2]

1.1.3 REGISTRO (ART. 967)

Antes do Novo Código Civil, existia uma discussão acerca de o empresário estar apto a exercer a atividade empresarial somente após o registro, ou seja, se, mesmo sem o registro, ele poderia exercer atividades econômicas e não ser considerado empresário.

Isto é, só poderá fazer parte da classificação empresário aquele que estiver registrado no Registro Público de Empresas Mercantis.

O Prof. Fran Martins, por exemplo, defende que o registro é constitutivo, ou seja, só terá condição de ser empresário aquele que tiver registro no órgão competente.

Rubens Requião e Fábio Ulhoa Coelho afirmam que o registro tem natureza declaratória, ou seja, não é ele que dá a qualidade de empresário, mas a atividade exercida. Neste sentido, o empresário que não estiver registrado será considerado empresário irregular.

O Novo Código Civil não dirime esta polêmica, mas em seus artigos 971 e 984 expõe o seguinte sobre o empresário rural:

“Art. 971. O empresário cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode, observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição no Registro Público de Empresas mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro.”

“Art. 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário rural e seja constituída, ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade empresária, pode, com as formalidades do art. 968, requerer inscrição no Registro Público de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada para todos os efeitos, á sociedade empresária.”

Então, em face do empresário rural, o registro tem natureza constitutiva.

1.1.4 EXERCÍCIO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL (ART. 966)

Será empresário aquele que praticar com habitualidade atos considerados empresariais.

Como o próprio art. 966 (supracitado) prevê, os atos empresariais são: produção ou circulação de bens ou serviços.

1.1.5 VISAR LUCRO

Tem que ter intuito especulativo. Não existe atividade empresarial com essência filantrópica.

1.1.6 DESENVOLVER ATIVIDADE DE FORMA ORGANIZADA

Forma organizada significa ter estrutura empresarial. Fábio Ulhoa Coelho diz que só pode ser considerado empresário quando houver atividade economicamente organizada.

Atividade organizada é a articulação dos fatores de produção, ou seja, capital, mão-de-obra, insumos, tecnologia. É a conjugação de capital e trabalho.

Desta forma, seguindo o entendimento de Ulhoa Coelho, vendedores ambulantes, como, as vendedoras de produtos da Avon, não podem ser consideradas empresárias por não ter estrutura empresarial.

Alguns indícios nos ajudam na hora de determinar o que é organização/estrutura:

  • Empregar capital;
  • Utilizar mão-de-obra terceirizada;
  • Conhecimento específico/técnico sobre o assunto;
  • Trabalhar com insumos (produtos ou serviços).

1.2 NÃO SÃO EMPRESÁRIOS

Neste sentido, para facilitar o entendimento e dirimir possíveis dúvidas, é interessante definir aqueles que não são empresários.

A exceção está no parágrafo único do art. 966.

“Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.”

Então, não são considerados empresários os advogados, médicos, pintores, artistas, contadores e suas respectivas sociedades. Continuam como profissionais liberais.

Serão considerados empresários quando a atividade constituir elemento de empresa.

Elemento de empresa ainda não tem uma definição exata na doutrina. Contém apenas indícios do que seja. Neste sentido, quando estas atividades intelectuais recebem uma estrutura empresarial, tornar-se-ão empresárias.

Alguns indícios podem ser destacados:

  • Contratação de profissionais para exercer a atividade fim;
  • Forma que os sócios receberem o lucro. Um prestador recebe pelo número de atendimentos que fizer, mas, o sócio recebe pela sua participação na sociedade. Portanto, tendo sócio é uma sociedade empresária;
  • A atuação proceder como um todo, ou seja, um núcleo social organizado demonstrando haver uma forma de atuação social.

2 EMPRESA

O Direito Comercial sob a nova perspectiva da empresa, adotando o conceito subjetivista moderno, aumenta seu campo de abrangência passando a disciplinar as atividades econômicas incluindo dentre as atividades de produção e circulação de bens a prestação de serviços eliminando a desigualdade existente antes.

O legislador deixou de conceituar a empresa porque é multifacetária sendo complicado comportá-la num único conceito jurídico.

Asquini[3] sustenta que a empresa pode ter vários perfis:

  • Perfil subjetivo: a empresa é identificada a partir do empresário (art. 966);
  • Perfil objetivo: a empresa é identificada a partir do seu patrimônio e de seu estabelecimento preservando a existência da noção de fundo de comércio (art. 1142);
  • Perfil funcional: a empresa é identificada a partir de sua própria atividade onde se estabelecem os limites da atividade econômica (não tem previsão no NCC, mas em leis esparsas de antitruste e na CRFB, art. 170);
  • Perfil corporativo: a empresa é identificada como instituição, onde sua relação interna ou externa corporis poderá ser estudada, normatizada e regulada em razão dos propósitos e objetivos comuns àquelas que com ela se inter-relacionam (operários, capitalistas e fornecedores).

Fábio Ulhoa Coelho[4] diz que os perfis subjetivos e objetivo são uma nova denominação para os conhecidos de sujeito de direito e estabelecimento comercial. Quanto ao perfil corporativo diz que não existe empresa onde ocorra realmente uma corporação entre capitalista e seus empregados.

Embora no Brasil não se conceitue empresa, seu conceito pode ser extraído do de empresário.

Sendo assim, empresa é a atividade econômica organizada. Ela tem o mesmo significado que a advocacia para o advogado; que a medicina para o médico; que a engenharia para o engenheiro, ou seja, é a atividade exercida pelo empresário.

Desta forma, a doutrina adota o entendimento apenas do perfil funcional de Asquini.

2.1 NATUREZA JURÍDICA

Como a empresa é uma atividade, então ela não tem natureza jurídica, pois não é nem sujeito nem objeto. È o que afirma Fábio Ulhoa Coelho.

Rubens Requião afirma que “... a empresa não pode ser objeto de direito, porque a atividade não é objeto, e não pode ser sujeito, porque é precisamente uma forma de atividade do empreendedor ou empresário, que é o sujeito”. E continua dizendo o seguinte: “parece-nos, todavia, que a atividade pode constituir objeto de direito, posta sob tutela jurídica. Nessas condições, percebemos a empresa como objeto de direito”.

Ricardo Negrão diz que a empresa não pode ser considerada objeto de direito, pois tal classificação estaria reservada para o estabelecimento empresarial, mas sua natureza se explica no conceito de fatos jurídicos ou exercício de negócios jurídicos qualificados.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Dicionário acadêmico de direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 1999.

BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito societário. 5 ed ver aum e atual –Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. 5 ed atual – São Paulo: Lisa, 1991.

BULGARELLI, Waldirio. Sociedades comerciais: sociedades civis e sociedades cooperativas; empresas e estabelecimento comercial: estudo das sociedades comerciais e seus tipos, conceitos modernos de empresa e estabelecimento, subsídios para o estudo do direito empresarial, abordam ás sociedades civis e cooperativas. 8ª ed. São Paulo: Atlas, 1999.

CAMPINHO, Sergio. O Direito de Empresa - À Luz do Novo Código Civil. 4ª Edição – Rio de Janeiro: Renovar, 2004

COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol 2 – São Paulo: Saraiva, 2001.

___________________. Curso de direito comercial. Vol 2. 7 ed rev e atual – São Paulo: Saraiva, 2004.

___________________. Manual de direito comercial. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

CORRÊA-LIMA, Osmar Brina. Sociedade anônima. 2 ed – Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 1997, vol 1.

DYLSON, Doria. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 1991-1998.

OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Tratado de direito empresarial brasileiro. Campinas: LZN, 2004.

MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial . 28 Ed. São Paulo: Forense, 2002

MENDONÇA. José Xavier Carvalho. Tratado de direito comercial brasileiro. vol IV, tomo II. São Paulo: Russell, 2004.

NEGRÃO, Ricardo. Manual de direito comercial e de empresa. Vol 1, 3ª ed retorm. São Paulo: saraiva, 2003.

REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Vol 2. São Paulo: Saraiva, 1988.

_______________. Curso de direito comercial. Vol 2. São Paulo: Saraiva, 1998.

 

 

 

 


 

NOTAS:

 

[1] CORREA-LIMA, Osmar Brina. Mudanças no direito societário.

[2]CHAGAS, Henrique. Jornal da ADVOCEF, Edição n 09, Janeiro/2003 in www.escritorioonline.com.br

[3] ASQUINI, apud OLIVEIRA, Celso Marcelo de. Ibid.

[4] Op. Cit.

 


 

(*) Advogado. Pós-Graduando - MBA Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), em Belo Horizonte. Bacharel em Direito pelo Centro Universitário Vila Velha (UVV)

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